capítulo 4
joia falsa
— E ele simplesmente sumiu?
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— Foi. Como um fantasma.
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O copo em minhas mãos fez um barulho estranho, indicando que eu havia terminado meu frappuccino de caramelo, enquanto Dave ainda aquecia as mãos enluvadas no seu mocca. Estávamos naquela cafeteria há vários minutos, e eu escolhi aquele momento para contar tudo sobre meu “encontro quente” da noite anterior.
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Claro, Dave devorou cada detalhe como as migalhas do croissant que comprei para ele.
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— Jesus. — Foi seu veredito final. — Eu te arranjo um date, e você me volta amaldiçoado, Alex.
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Dave Collins era meu melhor amigo, ou algo parecido. O mais próximo que você poderia chegar disso quando se tratava de minha pessoa. Eu o conheci quando ele ainda usava fraldas — bem, um pequeno exagero. Ele tinha seis ou sete anos, e estava prestes a começar a escola nova. Ele era meu vizinho chato e insuportável que queria se juntar ao grupo de meninos mais velhos, que incluíam eu e Iza, meu primeiro namorado e má influência preferida. Ele sempre nos seguia apesar dos sapatos afivelados e saias rodadas de babados, enquanto meu uniforme era completamente alternativo. Mas a mãe dele pagava bem quando ela tinha que dar plantão no trabalho, então eu fingia suportá-lo até finalmente gostar dele.
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É tudo sua culpa,
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o sangue pingando de minhas mãos
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as lágrimas naquele olhar
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e era, era, era
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Senti um arrepio na espinha só de me recordar daquilo. Quando eu olhava para Dave, todas as memórias vinham, sempre. Era uma culpa que eu não conseguia expiar.
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Talvez Deus tivesse me amaldiçoado desde aquele dia.
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— Bem, eu, de fato, dormi com alguém.
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— Mas só dormir não conta. Você está sendo literal para distorcer os fatos.
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— Não fiz o que você pediu na aposta? Cumpri todos os termos. “Aceitei um encontro quente e dormi com um rapaz”. Mais sorte no Mario Kart da próxima vez.
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Dave fez um muxoxo, e sorveu mais do mocca. Ele ficava realmente adorável quando contrariado; e, por Céus, era uma das coisas que eu achava mais divertida de fazer: antagonizá-lo. Dave era três anos mais novo que eu, e ele tinha os olhos amendoados cor de mel, com a expressão de cachorro abandonado mais fofa que eu já tinha visto. Lógico, isso sempre amolecia meu coração duro e frio como gelo, mas não naquele dia.
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Naquele dia, eu era vitorioso naquela nossa aposta.
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Mesmo de uma forma estranha e especialmente esquisita.
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— Eu diria que você estaria mentindo para mim se não fosse uma história completamente fantástica e inacreditável — ele disse, por fim.
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O vi remexer no celular e olhar pelo visor da câmera frontal, checando a franja tingida de púrpura, assim como todo o cabelo.
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Eu sabia que aquilo não era um sinal de vaidade, porém. Dave era a última pessoa a ser vaidosa. Quando estava assim, era porque…
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— Nunca iria mentir pra você, e você sabe disso. — Dei meu melhor sorriso para ele, para tentar mudar de assunto.
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Ele parou de encarar o celular, e virou o visor para baixo. E sorriu. Bom. Aquilo era um ótimo sinal.
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— Bem, saiba que nossa aposta ainda está de pé. Você ainda tem que sair em um encontro com alguém.
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— Ei!
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— Mas sabe… — Ele colocou a mão no queixo, e afagou sua barba imaginária. Eu apenas ri. Dave não tomava hormônios a tempo suficiente para crescer barba. — É como o roteiro de um livro, sabe?
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— Como assim?
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— Vocês na chuva, um encontro…
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— Está mais para um agarro.
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— Que seja. Um encontro do Destino, eu colocaria assim. Como almas gêmeas destinadas a se encontrarem, akai ito. Sei lá. Meio romântico.
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Eu dei de ombros. Por alguma razão, aquelas palavras me pareciam muito além do escopo.
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— Eu só achei que ele precisava de alguém. Poderia ser qualquer pessoa. Poderia ser você, no meu lugar, indo a um encontro quente.
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Dave pareceu refletir.
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— Mas foi você, Alex. É o que importa.
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O que eu podia fazer?
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Eu suspirei.
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— Bem, destino ou não, não irei procurar mais trabalho do que já tenho agora. — E apontei para Dave, que apenas sorriu, parecendo um pouco culpado. — Deixarei ao acaso.
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— Bem, você tem um nome e um rosto. É a época das mídias sociais. Encontrá-lo não seria tãaaao difícil assim.
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— Acaso, Dave. Se for para ser, assim será. Se era mesmo para nos encontrarmos, se os nossos Destinos estavam traçados no mesmo tear da Vida; tenho certeza de que nos encontraremos novamente.
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Dave pigarreou, rindo.
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— Você é mesmo um romântico incorrigível. Tudo bem, mas espero não ser um fantasma.
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Minha gargalhada ecoou pela cafeteria, e alguns alunos me encararam; sua paz perturbada pela minha inconveniência, portanto, eu era um estranho chato.
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Eu não me importava de chamar a atenção. Era o que quase dois metros de altura, uma tatuagem no rosto e cabelos pintados de vermelho vivo desde os treze anos faziam a você. Eu era uma criança problema desde que me entendia por gente. Podia não ter muitas amizades, e tinha mania de afastar a todos, com exceção de Dave; e era melhor assim, porém, a atitude permanecia. Eu não me importava com as pessoas.
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Dave, no entanto, se importava e muito com o que os outros pensavam. Como era mais novo do que eu, lógico que admirava a minha estética e me adorava, mas… ele não tinha a minha autoconfiança. Ou como chamava, o meu poder de mandar as outras pessoas se foderem. Ele ainda se escondia atrás de moletons maiores que seu tamanho, e mangas que se estendiam além dos seus dedos; fingia mexer no celular a maior parte do tempo, e, quando as mãos não estavam grudadas no aparelho, seguravam firmemente as alças da mochila púrpura, igual ao cabelo, da qual não se separava nunca.
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Comparado a Dave, você era menos tangível. Mesmo assim…
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— Espero que não tenha sido um fantasma. Eu me lembro bem do seu toque.
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As sobrancelhas de Dave se ergueram e quase se juntaram ante aquela nova informação.
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— Alex Morris, você não me disse que “tocou” ele.
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Bem, acho que dei detalhes demais. Peguei meu celular para tentar disfarçar.
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— Olha a hora. Acho que tenho que levar você pra a sua aula. — E comecei a me levantar. Peguei a minha mochila e o copo vazio, e fui em direção ao lixo comunal para descartá-lo.
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— Alex Morris! Volte aqui e me conte essa história direito!
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— Dave Collins, hora de sofrer junto com seus coleguinhas do curso de Escrita Criativa!
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Dave chegou ao meu lado, ainda segurava seu mocca quando peguei em sua mão. Era apenas um hábito, porém, pela temperatura fria das mãos de Dave, eu sabia que ele precisava. Ele segurou firme contra mim, e seguimos até o prédio em que sua aula era localizada, em silêncio.
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Eu sabia que, quando ele ficava assim, era porque mil pensamentos passavam por sua mente; eu tentava mudar de assunto, tentava estimulá-lo, como sua psiquiatra sugeriu anteriormente, mas Dave continuava em silêncio logo em seguida; então eu fiquei calado também. Não queria forçar nada. Só de tê-lo ali, ao meu lado, era o suficiente.
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Naquela época, eu não sabia de nada.
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— Chegamos — eu anunciei.
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Eu sabia onde eram suas aulas. Se eu sabia onde eram todas as minhas aulas? Claro que não. Era quase o final do semestre, e eu ainda precisava checar o portal do aluno para andar por aí. Só com Dave eu tinha uma atenção especial.
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— Está pronto?
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Ele parou em frente à porta. Estávamos um pouco afastados, portanto, pude observar um pouco do grupo de seus colegas. Eu os conhecia mais ou menos, Dave falara um pouco sobre eles. Ele os observava, mas não fez amizade com ninguém até então.
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Isso era outro problema que eu evitava pensar.
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— Eu acho que sim. — Ele assentiu, e olhou no celular de novo para ver sua aparência. — Estou bonito?
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Eu sabia que ele perguntava aquilo apenas por ansiedade, mas eu não diminuiria seu ego apenas por brincadeira. Apertei o nariz dele e disse:
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— Você é a pessoa mais bela que eu conheço.
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Ele riu.
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— Pare de puxar meu saco, Alex. Eu nem tenho um.
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Levei minha mão para seus fios arroxeados e arrumei-os mais ainda, como uma mãe faria. Kate ficaria orgulhosa de mim. Ao menos, ela admirava o modo como eu cuidava do filho dela. Ela gostava de dividir aquele fardo, já que era uma mãe solo, e o filho era um poço de problemas. Bem, Dave era uma gracinha.
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— Vai dar tudo certo. Eu te espero depois da minha aula. Você sabe onde é?
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— Eu sei. — Ele fez um muxoxo, e arrumou o próprio cabelo. — Você sabe onde é?
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Eu apontei para a enorme pasta de desenho que carregava.
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— A única aula que vale a pena. Anatomia.
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— Aaah, ver gente nua. Acho que você realmente está precisando disso.
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— Não depois de ontem à noite.
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Dave fez outro muxoxo.
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— Você realmente está omitindo muitos detalhes do que aconteceu. Prometa que vai me contar tudo depois da aula!
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Eu apontei em direção a uma pessoa que vinha pelo corredor, e dei alguns passos para trás.
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— Olha, aquele não é seu professor? Entra logo na sala, antes que você não possa mais entrar… Estou atrasado para a minha aula!
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Ele lançou um olhar para a pessoa, e simplesmente desistiu; no entanto, não antes de dizer:
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— Você está sempre atrasado, Alex.
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O que era uma verdade inegável, mas ao menos eu sabia o caminho para aquela aula em específico. Era do outro lado da faculdade, quase um universo de distância para que eu atravessasse; mesmo assim, eu o fazia de bom grado. Era meu dever fazer com que Dave chegasse às aulas bem e em segurança. Ao menos, foi essa a tarefa que eu mesmo me dei. Fazia tanto tempo que não conhecia diferente.
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Meus pensamentos me ocuparam por todo o caminho até a sala de desenho número nove. Eu não sabia o motivo dela ser numerada daquela maneira, já que não havia nove salas de desenho naquela universidade, mas aquela era especial. Por quê? Aquela era a única sala com o mínimo de aquecimento decente. E aquilo importava muito na aula em questão, especialmente com o frio de novembro que ameaçava a tornar-se inverno. Em breve, todo aquele campo em que eu atravessava seria tomado pela neve branca, e seria muito mais difícil a travessia. Mas a beleza da neve, das geadas, e do ar frio não me escapavam. Eu amava o inverno, apesar da primavera ser a minha estação preferida. Era a expectativa de uma época mais doce estar lhe esperando na esquina.
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Eu cheguei ao prédio, e algumas pessoas fumavam na entrada. A urgência me atingiu, porém, me contive. Já estava muito atrasado, e abrir a carteira nunca era apenas para um ou dois cigarros. A ansiedade os consumia com voracidade.
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E eu simplesmente queria chegar logo.
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Queria voltar para Dave, e garantir que estivesse bem. Quando não estávamos juntos, era um fator preocupante em minha mente, em horríveis espirais. Não era exatamente saudável, mas, mesmo assim…
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Eu abri a porta e entrei com a cabeça baixa, esperava que o professor não me notasse. Difícil quando você era quase maior do que a própria porta.
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— Morris, bom que você se juntou a nós; pegue um cavalo e vá desenhar.
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— Certo…
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Tirei meu casaco quando o ar quente me atingiu, já que minha furtividade falhou; mas assim que coloquei os olhos no modelo vivo, eu parei.
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Eu já dissertei bastante sobre primeiros encontros, não foi? O que falar então de segundos olhares, especialmente quando a pessoa em questão estava nua em pelo em um palco? Não era uma situação estranha, dada a natureza da aula. Só que o modelo vivo era você, Jesse, e estava plenamente concentrado; olhava em linha reta, sentado em cima do tecido vagabundo que a faculdade providenciava aos modelos, e parecia, em geral, desconfortável.
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Podia ser qualquer pessoa ali. Eu tinha certeza de que era o “meu” Jesse por três motivos: o ferimento no rosto, que continuava roxo e parecia um pouco pior na luz intensa do palco; a tatuagem de hortênsias em suas costas; e, derradeiramente, o modo como me encarou ao me ver entrar na sala.
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É, você me reconhecia.
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Prontamente voltou a encarar o nada, e ficou na pose original.
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— Morris, vai ficar igual a peixe morto aí? Vá se arrumar!
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Murmurei uma desculpa apressada, e fui em direção ao montante de madeira e peguei um suporte; deixei minhas coisas em cima de uma das cadeiras pretas apressadamente, com o coração subitamente acelerado. Como eu deveria agir? Era mesmo você ali em cima do palco? Dirigi um esgar de volta, espiando. Era mesmo você. Não era um sonho. Belisquei-me apenas para garantir.
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Olhei de novo.
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Agora eu tinha um problema.
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Como ia ser capaz de continuar com a aula e desenhar seu corpo nu?!
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um pequeno interlúdio
Naquela época, não parecia nada.
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Naquela época, parecia Destino.
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Meu impasse foi resolvido pelo professor, que, novamente, me chamou a atenção, e eu me instalei no fundo da sala, mas eu não desenhei. Tentei ocupar a maior parte das páginas com alguns exercícios de alongamentos. Nunca desenhei tantos círculos. Fiz linhas, curvas, jogos da velha.
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Tudo para evitar de olhar o pecado à minha frente.
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Você parecia fazer de propósito. Todas as suas poses pareciam sensuais. Quase o detestei imediatamente. Tentava ao máximo não olhar, mas era quase impossível. Uma tarefa hercúlea. Era como se todo o meu ser fosse atraído, e tentei meu máximo me comportar para não sair e perguntar a ele como ele estava.
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Droga, eu tinha passado a noite com você! Tinha chorado nas minhas costas!
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Queria saber o motivo de ter saído de fininho, sem falar nada. Agora, vários motivos me vinham à mente: poderia ter trabalho mais cedo, não é? Aquela podia não ser sua primeira aula. Eu não sabia qual era o cronograma de aulas da universidade (francamente, eu mal acompanhava o cronograma do meu próprio curso), no entanto, não devia ser modelo apenas para aquela aula em específico. Era um milagre ter aparecido apenas àquela altura do curso em andamento. Estávamos em novembro. Era mais da metade do semestre.
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Seria uma coincidência muito fodida…
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Ou o Acaso? Parecia que eu o tinha invocado.
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De qualquer forma, eu senti o chute da bunda do Destino. Suspirei e me dei por vencido. Eu havia jogado com a Sorte, não era? Havia dito aquilo, e não podia voltar atrás. O que quer que acontecesse daqui para frente, seria sua escolha, Jesse, e que eu fosse levado por aquela correnteza.
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Levantei meus olhos por um momento, em um breve intervalo entre as poses, e mandei uma mensagem para Dave.
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Alex: Você não vai acreditar no que acabou de acontecer.
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Quando o intervalo acabou, voltei a desenhar, mas não me concentrei nem um pouco no que era passado na aula. Ao invés disso, me concentrei nas suas formas, Jesse, e nas memórias da noite anterior. Meu carvão passeou preguiçosamente sobre o papel, desenhando, traçando, um músculo ali, nos seus bíceps avantajados, a tatuagem enigmática de hortênsias, os olhos marcantes…
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Nos encaramos.
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— Ah… — eu quis dizer algo.
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Era como se houvesse apenas nós dois na sala, e não uma turma inteira de vinte e seis alunos, meus colegas do curso de Ilustração. Quando você me encarou, eu soube que…
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Um som alto irrompeu, e eu percebi que estava perdido quando suas sobrancelhas se abaixaram, incomodado. Era meu toque, e eu sabia que era o meu, porque havia selecionado aquela música em especial apenas para uma pessoa.
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Dave.
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Merda.
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— Alô? Dave, o que aconteceu? — Atender ao telefone foi algo automático.
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Eu precisava atender. A ansiedade subiu como uma flecha à boca do meu estômago, e eu o senti revirar. O que aconteceu? Por que ele me ligou? O que era tão urgente para ele me ligar no meio das nossas aulas?
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— Ei! — Ouvi a sua voz pela primeira vez naquele dia. — Sem telefones!
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— Morris, você sabe disso. Não pode usar telefones durante a aula enquanto o modelo está nu — meu professor, o sr. Harris, ralhou. Ele era um homem sério, careca, mas muito bondoso. Para ralhar conosco era necessário muito para tirar-lhe do sério. — Vá atender lá fora.
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— Desculpe — murmurei, e corri porta afora.
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Apenas ouvia a voz assustada de Dave do outro lado da linha, sem compreender direito o que ele me falava. Assim que consegui um lugar silencioso, longe das pessoas, repeti minha pergunta.
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— Dave, o que aconteceu?
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A voz dele saiu baixa e um pouco áspera, porém, audível o suficiente para que minha preocupação pudesse se aquietar um pouco.
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— No que eu não vou acreditar?
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Eu suspirei.
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— Dave…
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— Ah, você atiçou a minha curiosidade. Vamos lá, estou esperando!
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— Você não está em aula?
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Ouvi o silêncio vindo do microfone, e eu soube que tinha atingido em cheio. Sentimentos que eu conhecia muito bem o nome, mas que eu frequentemente enfiava de qualquer jeito dentro de uma caixinha dentro de mim, para não lidar com eles, ameaçaram aflorar. A caixa de litígio sendo aberta.
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Eu não podia lidar com aquilo agora.
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— Ah, Dave… — suspirei.
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O que eu iria fazer? O certo era ir até ele, mas eu ainda queria falar com você, Jesse. Eu não queria largar tudo e ir até meu amigo. Sem falar que eu não podia faltar muito mais aulas. Eu já estava na mira dos meus professores para cortarem a minha bolsa. Tinha de manter o bom exemplo. Só que…
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— Quer que eu vá pra aí?
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— Não… — A voz dele saiu baixa. Eu sabia que ele não estava bem. Aquilo me angustiou. Droga. Não havia notado os sinais de novo. Merda. — Eu tô bem. Sério. Termine sua aula, depois conversamos.
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— Mesmo?
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— Sim. Quero aproveitar a brisa de outono. — Ele riu.
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— Se você diz… vou indo, e te encontro logo depois. Mais rápido que um meteoro.
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— Obrigado.
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E ele desligou a ligação, me deixando ali, sem chão.
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O que eu poderia fazer?
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O que eu devia fazer?
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Eram duas perguntas cujas respostas nunca teria.
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Voltei para a sala, e fiquei em silêncio o resto do tempo, esperando. Estava claro que você não mais iria me dirigir o olhar; e pelo modo como me ignorava, estava determinado a sair correndo dali quando a aula se findasse.
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Era uma pena que eu estivesse pronto para acabar com seus planos.
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Esperei para dar o bote quando o alarme soou. Meus colegas começaram a arrumar as coisas, e a conversa rolava solta. Eu vi o professor responder a dúvida de alguns alunos e arrumar seus materiais para sair, enquanto eu vestia meu casaco e fingia estar muito interessado no meu celular. Em realidade, meu olhar ia de esguelha para a figura solitária no palanque, que se levantou, ainda nua, foi em direção a um pequeno amontoado de roupas em uma cadeira preta de armar, e as pegou; parecia distraído. Reconheci a jaqueta vermelha do dia anterior, assim como algumas das roupas. Quando você foi embora na noite anterior, deixou as roupas que eu emprestara arrumadas em cima da cômoda, o que provava que eu não tive uma alucinação.
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Nem que você era um fantasma.
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Cada vez mais você se tornava tangível, próximo de mim.
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Meu coração batia forte, como se eu fosse fazer alguma travessura. Mas era um plano muito arriscado, porque eu não sabia qual seria sua reação; eu apenas queria…
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O que eu queria?
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Eu não sabia.
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Porém, eu era apenas uma peça naquele xadrez do Destino, então iria agir de acordo.
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Esperei o professor ir embora, assim como o restante dos meus colegas. Apenas você permaneceu, colocava sua roupa, e a jaqueta vermelha por cima de tudo. Céus. E pensar que eu havia visto tudo…
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Tentei não focar nisso.
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(Ao menos, não naquele momento. Eu tinha alguns blocos de desenho em casa afinal. Ficaria inspirado por dias.)
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— Jesse?
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Ao ouvir o som do seu nome, você se virou, assustado. Os olhos azuis se arregalaram ao me reconhecer, porém, não havia nada do garoto assustado da noite anterior. Ao contrário, lá estava a mesma fera ferida que eu encontrara na ponte. As garras prontas para atacar.
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— O que você quer?
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Bem, hora de rolar por carisma.
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— Você está melhor?
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Você olhou para mim, como se não soubesse o que responder. Era uma pergunta muito carregada de significados, então não a respondeu diretamente.
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— Você disse que não se importava.
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É, aquilo era verdade. Ou ao menos, eu tentava.
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— Bem, você saiu da minha casa sem falar nada…
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— Você preferia que eu ficasse?
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Não que eu esperasse um café da manhã regado com mais silêncios, mas eu realmente não sabia o que esperar. Eu só… não sei. Eu não sabia o que fazer em relação a tudo. Eu queria fazer muito mais por você.
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Se me permitisse.
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— Eu tinha outra aula antes dessa. — Deu de ombros. — Não é da sua conta pra onde eu vou ou deixo de ir.
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— Isso é verdade. — Eu cocei a cabeça, e embaracei ainda mais meus fios vermelhos. — Mas… talvez eu gostaria que fosse.
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Você se virou e ergueu uma sobrancelha, porém, parecia decidido a não me dar ouvidos. Terminou de calçar os tênis xadrez e deu meia volta por mim; eu o segurei pelo braço.
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— Olha, possa ser que eu esteja me intrometendo demais… — comecei, meu tom um pouco desesperado. — Eu só queria saber se você estava melhor.
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— Estou. Pode me largar.
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Fiz como foi dito, mas você parou para me ouvir. Era uma chance.
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Eu não ia desperdiçá-la.
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— Olhe, eu acho que começamos com um pé esquerdo. Eu apenas queria pedir desculpas pelo que aconteceu na aula, pra começar.
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Ele suspirou.
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— Seu nome é Alex, não é?
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— Sim.
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— Alex, não sou um projeto de caridade.
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Como era orgulhoso.
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— Eu sei, eu sei. Deixe-me explicar melhor… eu não sei pelo que você tá passando, quais problemas tá enfrentando. — Apontei para o ferimento no rosto, o qual você levou a mão instintivamente. — Eu só sei que, às vezes, uma pessoa precisa de um refúgio para ir de vez em quando.
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Você ficou em silêncio.
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— Eu só queria dizer que, ao invés de ir para aquela ponte, você pode me ligar, a qualquer hora do dia ou da noite. Eu vou atender.
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Estendi um fragmento de papel, no qual havia, apressadamente, anotado meu número de telefone.
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Você não o pegou. Apenas o encarou, como se fosse algo profano.
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— Você não pode fazer esse tipo de promessa.
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— Eu normalmente cumpro as promessas que faço. Palavra de escoteiro. — Pisquei, divertido.
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— Não posso aceitar isso — disse, incerto. Seus olhos não deixavam o papel, mas ele não se virou para pegá-lo.
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— Bem, vou deixar aqui em cima da mesa — eu arrisquei, e o coloquei em cima da mesa do professor, bem visível para ambos. — Se você vai levar, ou se alguém vai jogar fora, vamos deixar a seu encargo. Apenas… não fique sozinho, Jesse.
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De novo aquele silêncio, porém, eu fiz a minha tentativa. Estava na hora de ir.
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Alguém precisava de mim também.
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— Preciso ir. Espero, de coração, que você fique bem, Jesse.
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E o deixei ali, naquela sala aquecida, e parti em direção à minha função principal.
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Não foi difícil achar Dave. Nunca era. Era só procurar um local com árvores, ou o local com o menor número de pessoas. Achei-o em um canto da praça principal, escondido entre os arbustos, nas mãos, uma caneta enquanto escrevia em frenesi; quando me viu, levantou a cabeça apenas o suficiente para que eu visse que chorava.
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Ah, Dave.
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Ele havia melhorado tanto. Mas…
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— Dave… — murmurei, e apenas me sentei ao seu lado na mureta, compreendendo tudo. Eu não fazia perguntas.
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Apenas o abracei, e deixei que despejasse seus sentimentos em mim.
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Amanhã seria melhor, eu esperava.
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Eu rezava.
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interlúdio
Era quase impossível enxergar no escuro, mas, à meia luz, seus cabelos refletiam os raios dourados que vinham da janela acima da geladeira, enquanto sua respiração rítmica era tudo que eu ouvia, além da minha própria voz. Nada mais restava naquele apartamento. Não havia mais materiais de arte, projetos inacabados, nem o banquinho que um dia me sentei para desenhá-lo.
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Só eu e você.
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— Jesse — falei seu nome, como se quisesse agarrá-lo, como se dizer seu nome pudesse, de alguma forma, torná-lo tangível.
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Não me atrevia a tocá-lo. Sua imagem era pálida, como se eu visse, de fato, um fantasma à minha frente; fruto saído de meus pesadelos mais profundos, e, no limiar da minha consciência, eu queria saber.
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— O que você viu na ponte naquele dia? O que o fez subir no parapeito, no meio da chuva, com nada para se segurar?
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Achei que receberia apenas o silêncio como resposta, com seus olhos azuis inexpressivos me encarando de volta; mas sua voz, como eu me lembrava, falou:
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— Eu vi uma luz. Um alien. Sei lá. Foi tudo, e foi nada.
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— Você sempre esteve buscando coisas inalcançáveis.
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Você sorriu, no entanto, não de verdade.
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Eu me levantei e acendi outro cigarro.
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E o vento que saiu de seus lábios veio misturado de meus pensamentos, suas verdades, e palavras nunca ditas.
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Eu era uma supernova.
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Uma estrela que um dia brilhou nos céus, mandando sua luz para toda a galáxia; e, agora, depois de uma explosão, aos poucos se transformava e consumia tudo ao seu redor.
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E levaria todos comigo no processo.
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Uma merda de supernova.
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Para piorar, o dia estava congelante, o ônibus lotado, então a volta para casa foi mais torturante que o costume. Não que eu tivesse opções. Kurt tinha decidido me ignorar até aquele momento; e eu estava puto com ele o suficiente para não aparecer em sua casa sem aviso, portanto, precisava voltar para algum lugar. Com sorte, Chase não estaria em casa. Meu irmão era popular. Ele tinha lugares a ir, pessoas para ver. Não-namorados para foder.
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Ele não me esperaria em casa.
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Eu nem me preocupava com a possibilidade de Nama estar lá. Seu cronograma de trabalho era tão fodido, por ser uma enfermeira trabalhando em um hospital público, que raramente a via. Honestamente, era uma benção. Estar em sua presença era um martírio que preferia evitar. Podia simplesmente me esgueirar pela porta da frente, e, quando tinha o azar de sua presença em casa, pular da janela do segundo andar onde ficava meu quarto. Não seria a primeira vez que escapava desse modo, nem seria a última. Não que considerasse a casa onde minha mãe e meu irmão moravam meu lar.
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Mas eu já não poderia voltar mais para o número doze das ruas da Margaridas.
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Não depois daquilo.
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Suspirei.
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Eu estava fedendo também. Trabalhar três dias seguidos, sem tomar um banho decente, e, principalmente, depois de uma foda com um estranho, não eram as circunstâncias mais ideais. Claro que eu não poderia ter previsto que toda a merda ia atingir o ventilador desta maneira, mas…
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Olhei pelo vidro do ônibus. Ah, eu tinha tomado banho na casa do tal Alex, não era? Alex Morris. Carinha interessante. Bonito. Meu tipo, com certeza. Só que… não estava interessado em mim, mesmo com todo aquele discurso para me dar seu telefone. O papelzinho queimava dentro do bolso da minha calça; e eu, acima de tudo, tentava ignorá-lo. Dizia a mim mesmo que só o pegara para não deixar lixo em cima da mesa de trabalho. Que o jogaria fora assim que chegasse em casa. Melhor, colocaria fogo nele.
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Só assim teria paz.
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— Rua das Margaridas — a voz eletrônica anunciou, e eu acionei o botão de parada, e me ergui para sair do ônibus.
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Passei por várias pessoas no caminho, e desci. O ar frio de novembro me abraçou, e despejei meu desespero nele.
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Eu não queria voltar para aquela casa.
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Mas que escolha tinha?
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Caminhei devagar tentando pensar. Escolhia as palavras com cuidado, repassava cenários em mente. As possibilidades que aconteceriam assim que eu girasse a chave e viesse me encontrar com meu irmão. A verdade é que a briga estava muito enevoada nas minhas memórias. Eu mal me lembrava do que eu havia dito ou deixado de dizer, porque eu havia bebido, e muito. Mas sabia que havia magoado meu irmão, da pior maneira que eu poderia tê-lo magoado. Não poderia ir e consertar aquilo.
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É difícil “destirar” alguém do armário.
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— Merda…
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Ainda parei alguns minutos na frente da casa. Imponente. Anos quarenta. Imperial. A típica casa dos sonhos perfeitos, com cerca branca e tudo. Um dia, fora de meus pais, antes do divórcio, antes do desastre completo. Um casamento perfeito, dois filhos gêmeos, um cachorro ou um gato. Netos. Este era o futuro com o qual Nama Bennett sempre sonhou.
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Bem, olha só o que ela conseguiu.
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Uma supernova prestes a explodir.
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Girei as chaves mais uma vez nas mãos antes de dizer:
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— Foda-se.
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E abri a porta mesmo assim.
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O calor e o silêncio me receberam. Pensei que teria paz, que conseguiria ir para o meu quarto tranquilamente, quando notei a figura no sofá da sala, que me pegou. Um xingamento escapou da minha boca ao mesmo tempo que meu nome saía dos lábios dele:
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— Jesse.
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— Merda, Chase. Que susto.
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— Precisamos conversar.
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Estava aí a frase que eu mais temia ouvir. Teria ele esperado a manhã e começo da tarde inteira até que eu chegasse em casa? Ele não conhecia a minha rotina de trabalhos, visto que eu recebia meu cronograma semanalmente; e eu não anunciava para ninguém em casa para onde eu ia nem o que iria fazer. Eu tentava ser o mais livre e desimpedido possível.
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Aparentemente, isso não impedia o meu irmão gêmeo de querer saber onde eu estava.
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— Achei que você não queria mais falar comigo. — Bem, eu faria de tudo para escapar daquela “conversa”.
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Não estava pronto. Achei que estava, porém, só de falar aquela frase, sentimentos se embolaram em minha garganta, como se uma pedra a travasse, e me senti pronto para vomitar. Tirei meus sapatos e, com eles em mãos, tentei correr escada acima, passando com estrondos pelos retratos de família, que minha mãe insistia em pendurar, e eles insistiam em cair conforme passávamos pelas escadas.
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(Não havia ele nas fotos).
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— Eu sei o que eu disse, por que você tem que ser sempre assim?
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Chase parecia decidido, no entanto, porque se levantou de supetão do sofá e foi em minha direção. Não subiu as escadas, ficou no andar de baixo e me olhava dos pés a cabeça.
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— Você não precisa fazer isso. — Eu fui categórico.
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— Claro que preciso. E você sabe o porquê?
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Eu não queria saber.
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eu queria
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— Porque, no fim, você é meu irmão. E eu te amo. Eu ainda não consigo te perdoar pelo que você fez, porque me magoou muito. Talvez, no futuro, eu consiga. Acho… tentarei me esforçar pra isso.
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Encarava o corredor escuro do segundo andar, mas aquelas palavras me trouxeram lágrimas aos olhos. Eu fazia o máximo de esforço para não chorar na frente de Nama ou de Chase, porém, ter uma réstia de perdão, ou uma possibilidade, me animou.
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Eu não podia errar mais.
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— Desculpe-me, Chase — eu pedi, baixinho.
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— Se você quiser conversar mais sobre o que aconteceu… — Chase ofereceu sua mão.
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Porém, eu não podia. As palavras estavam emboladas. Todas juntas. Todas presas.
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Não podiam sair.
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— Se estiver tudo bem com você, eu prefiro ir para o meu quarto. Eu preciso resolver algo.
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Chase baixou o olhar, mas sorriu.
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Ele sempre sorria.
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— Claro, claro. Fique bem, Jesse. Foi mal o soco. Não devia ter me exaltado, mas…
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você mereceu
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Ele apontou para o próprio olho, sabia que eu era seu reflexo quebrado.
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— Tá.
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Aquilo encerrava o assunto, e corri de volta para meu quarto.
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Meu quarto era o meu refúgio. O local onde as supernovas nasciam. Um pequeno universo em miniatura; e, no escuro, não havia estrelas brilhantes ou galáxias que se desfaziam. Era apenas eu e meus pensamentos cíclicos. Meu próprio buraco negro.
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E como me desintegrava a cada palavra não dita.
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Não acendi as luzes. Ainda estava com uma réstia de luz vinda da janela, mas como era novembro, eu sabia que iria anoitecer em breve. Eu não me importava. Eu queria a escuridão. Era bem-vinda. Já estava em meu interior, poderia muito bem vir visitar meu exterior também.
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Deixei o conteúdo dos meus bolsos em cima da minha cômoda, o que incluía meu celular, minha carteira e minhas chaves. Comecei a tirar a minha roupa e decidi que um banho estava em ordem, mas não agora. Estava sem forças. Joguei-me na cama e fechei os olhos contra o travesseiro.
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Eu queria morrer.
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Aquele pensamento era recorrente, e não tinha lugar algum para ir. Eu queria morrer, mas não me esforçava para viver, ou sequer me matar. Existia em um limbo, um dia de cada vez.
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Na realidade, o que eu mais desejava era não existir.
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Será que tinha algum botão no universo para criar um buraco negro bem ali, que apagasse a minha existência do espaço-tempo? Desse modo, eu não atrapalharia as pessoas ao meu redor. Não seria mais um fardo, ou, ao menos, seria apenas uma despesa financeira por uma última vez. Deixar de ser um problema pelo qual as pessoas falavam pelas costas.
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Eu só queria desaparecer.
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Não sei estimar quanto tempo fiquei ali. Apenas vi as horas passarem, olhando o teto; o dia virar noite.
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No escuro, uma estrela se acendeu.
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Meu celular.
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Devia ser mensagem de Kurt…
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Ergui a mão o suficiente para pegar o celular da cômoda, mas algo caiu em frente aos meus olhos. Não apenas algo — um pequeno pedaço de papel. O maldito papel com o número de Alex Morris.
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Eu ia jogá-lo fora, não é mesmo? Não ia ter mais contato com ele. Não iria arrastá-lo também para o vórtex que era a minha vida. Ele parecia ser gentil. Importava-se demais com as pessoas, apesar de declarar diversas vezes o contrário.
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Só que…
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Ele falou que eu podia mandar mensagem, não é?
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Jesse: Ei.
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Você disse que eu podia mandar mensagem a qualquer hora.
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É o Jesse.
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Me senti estúpido ao enviar, porque era, acima de tudo, uma mensagem estúpida. Ele nunca veria aquilo. Sem falar que era uma frase vazia. Promessas vazias. Revirei os olhos, e recoloquei o celular em cima da cômoda.
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O celular acendeu de novo.
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Peguei-o como se fosse um bálsamo.
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Alex: E aí. Como está, Jesse?
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Bem, ele poderia melhorar a cantada dele.
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Jesse: Poderia estar melhor 😉
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Alex: Pois é, o tempo está horrível.
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Jesse: ????
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Alex: Achei que quisesse se concentrar em outra coisa. Estou errado?
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Ponto para ele.
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Jesse: Você está certo.
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Alex: Estou à disposição.
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Encontrei-me sorrindo pela primeira vez naquele dia. Quem diria que Alex Morris teria aquele efeito em mim. Era bonitinho, sim, pela foto de perfil. Talvez…
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Alex: Ei, você quer sair qualquer dia desses? Acho que começamos errado, e eu quero te ver fora da faculdade. Quer sair pra tomar um café?
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Considerei bastante aquele pedido. Talvez fosse errado me envolver com ele, talvez fosse o que eu precisasse. Talvez eu simplesmente estivesse de saco cheio. Talvez…
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talvez eu quisesse viver, afinal.
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Jesse: Estou livre na Sexta.
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