capítulo 3
correnteza
O caminho para a minha casa foi lento. E o pior, com um silêncio sepulcral. Somente a chuva nos acompanhava, caía sobre nossos ombros como lâminas de gelo. Eu não sabia direito como me portar, porque era a primeira vez que me colocava na posição de trazer um completo estranho, até então, para o meu apartamento; e porque tal estranho estava completamente mudo. Cabisbaixo, desviava o olhar a todo minuto para trás, como se fugisse de algo. Muito estranho e preocupante.
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Eu era um solucionador de problemas em primeira instância, mas aquilo parecia ser uma dor de cabeça que não teria fim. Concentrei-me apenas em alcançar o meu apartamento com passos longos, para enfrentar a tempestade que se formava sobre a minha cabeça e dentro do meu coração. O que eu faria com você?
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Revirei as chaves dentro do meu bolso enquanto dava uma olhada para trás. A cabeça loura e baixa denunciava várias nuvens pesadas, além da chuva sobre nós. Eu admitia que havia uma semente de curiosidade em mim, porém, tratei logo de podá-la. Não queria intimidá-lo. Mais do que tudo, queria apenas que você ficasse bem.
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Talvez eu conseguisse distraí-lo um pouco… comida geralmente me colocava de bom humor.
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Eu pediria uma pizza ou algo do tipo assim que chegasse em casa, decidi. As pessoas sempre ficavam mais alegres de estômago cheio.
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E, ao dar uma última olhada em você, certamente ficaria melhor com um sorriso no rosto.
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— Chegamos — eu disse, e tentei parecer animado.
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Você finalmente levantou os olhos azuis dos tênis com padrões xadrez e olhou em volta.
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Se pareceu reconhecer o local, não demonstrou nada. Não estávamos longe da faculdade do qual eu era aluno, e o bairro era populado por universitários e funcionários da Universidade. Claro, havia um ou outro assalto, um ou outro assassinato, mas fatos da vida urbana, não era mesmo? Em geral, era seguro.
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— Venha.
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Eu girei as chaves nos dedos, na tentativa de fazer uma gracinha, porém, as chaves caíram com um som pesado no chão, me distraindo; e eu tive que pedir desculpas a você pela confusão. Estava me mostrando um tolo. Sem mais delongas, eu abri a porta, e o bafo quente do aquecedor caiu sobre nós. Eu limpei meus pés no carpete, e fiz menção para que você entrasse atrás de mim. Você me seguiu, atento, os olhos exploravam cada canto empoeirado do corredor, que dividia os apartamentos daquela casa geminada. Meus vizinhos com certeza já dormiam, ou estavam chapados demais para perceber que eu chegara em casa tão tarde da noite. De qualquer forma, não era como se eu devesse satisfação a eles.
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Sua insegurança era notável, então uma necessidade inconsciente surgiu em mim, e, antes que eu pudesse me conter, me vi alcançar seus fios rebeldes, que ainda estavam bem úmidos da chuva que tomamos; acariciei sua cabeça levemente, arrepiando e espalhando água pelo corredor. Isso pareceu chocá-lo um pouco, porque você elevou o olhar e arregalou-o, igual a um cervo assustado. Pensei que tivesse cometido um erro, porque era algo que eu sempre fazia quando Dave estava para baixo, mas resolvi não me perder muito naquilo. Quando me virei para encará-lo, notei aquele machucado outra vez… talvez você não quisesse ser tocado.
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— Ern… — hesitei. — Vamos entrar? — Eu dei passagem para que entrasse primeiro no apartamento, e uma escolha.
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Você ainda poderia dar as costas e ir embora, mas eu sabia que não tinha mais para onde ir. Ao menos, não naquela noite.
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Eu era sua única salvação, como o diabo em frente à Cruz.
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Coitado, pensei. Podia ter uma opção melhor do que a mim, que sou um pé rapado sustentado pela bolsa da faculdade. Podia ter sido um CEO rico que o tiraria da miséria e o sustentaria, como em um daqueles romances. Esse rapaz merecia todos os mimos possíveis.
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Ao menos, era o que parecia. Tirando o ferimento que ameaçava ficar muito feio no supercílio, eu não podia negar que você era muito bonito. Muito meu tipo, eu temia. Olhos azuis profundos, que eu já havia notado, e que escondiam muitas histórias. Eu saíra de uma correnteza, e estava prestes a me afundar em outra.
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Sorte a minha.
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Você, ao se ver sem saída, entrou primeiro na minha casa. Contudo, não precisou caminhar muito para se ver em um impasse.
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— Você gostaria de tomar um banho? — Eu comecei a retirar meus sapatos, e os coloquei na cômoda perto da entrada, como era o meu costume.
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Depois me preocuparia em limpá-los, o importante seria acomodar a minha inesperada visita primeiro.
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Meu apartamento naquela casa não era nada espaçoso. Quando eu falava que morava sem luxos, era porque eu realmente não tinha quase nada. “Quarto e sala” era uma grande hipérbole: era literalmente uma grande kitnet. Uma sala grande demais, com uma cozinha equipada e uma cama de casal nela. Ah, ao menos eu tinha máquina de lavar e secar no banheiro, não precisava dividir, como era o caso dos vizinhos. Era por isso que tinha escolhido aquele apartamento em específico.
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E, também, por algo mais especial…
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— É pequeno, desculpe — respondi a você, que continuava mudo e olhava para o apartamento, e tudo que eu tinha.
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— É… — concordou, mas tirou seus tênis dos pés e colocou ao lado dos meus na pequena cômoda.
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— Me dê seu casaco, vou pendurar.
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— Obrigado. — Aparentemente, você era uma pessoa de poucas palavras, porque era só isso que eu conseguia arrancar.
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— Você quer tomar um banho? — perguntei de novo e, dessa vez, você prestou atenção em mim.
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— Sim… ai! — O seu casaco enroscou no ferimento, e você gemeu de dor.
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— Ah, talvez devêssemos tratar disso primeiro, antes de você tomar banho. Colocar um gelo na ferida. Talvez pedir algo pra comer.
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— Isso aqui não é nada. — Colocou a mão sobre a ferida, antes de gemer de novo de dor. — Já sofri coisas piores.
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— Vai por mim, isso só vai piorar se você não colocar gelo. Vamos, eu acho que eu tenho uma bolsa térmica ou algo do tipo por aqui. Ou posso improvisar algo. Sente na cama, por favor.
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E corri em direção à cozinha, pronto para fazer o que havia prometido, já que você parecia muito assustado para fazer qualquer coisa. Eu procurei minha bolsa térmica, e a encontrei dentro de um dos armários, não dentro do congelador, onde ela deveria estar. Já que era assim, eu peguei algumas pedras de gelo e uma toalha; fiz uma bolsinha térmica improvisada, e voltei ao meu convidado.
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— Pronto, coloque aí.
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— Juro que não precisa…
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— Por favor, por mim.
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Você se resignou e se sentou na cama. Gemeu mais um pouco e colocou os pés com as meias em cima da cama, enclausurando-se; se abraçou como se seu pequeno mundo consistisse apenas do que pudesse tocar, do que pudesse envolver com as mãos.
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Meu coração se apertou, não parecia certo.
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Aproximei-me da cama e me sentei ao seu lado. O peso da cama afundou mais com o segundo corpo na cama, e rangeu ao ato; eu só vi os olhinhos azuis se moverem, atentos a cada movimento meu. Com uma ação muda, pedi permissão para colocar a toalha contra o ferimento; e apesar da desconfiança e de sua insegurança, você abaixou os braços para que eu pudesse cuidar de seu ferimento.
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Ainda gemeu um pouco.
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— Está tudo bem. — Tentei tranquilizá-lo um pouco. — Vai ficar tudo bem.
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— Só você acha isso — retrucou.
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Seus olhos eram realmente azuis. Nada de lente. Um azul profundo e límpido, mas que não conseguiam encarar a mesma pessoa por muito tempo. Você desviou o olhar e sua pele enrubesceu nas maçãs do rosto; eu pude contar cada pequena sarda de sua pele. O ferimento acima do supercílio esquerdo era feio, como se tivesse levado um golpe nos olhos. Só que não notei apenas isso. Você tinha um nariz arrebitado, muito adorável, e lábios cheios igual a um querubim.
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— Pode deixar que eu seguro — disse, e tocou brevemente sua mão contra a minha; você fechou os olhos por um momento.
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O silêncio que se instalou entre nós pareceu mais calmo enquanto você segurava a minha mão. Era como se você precisasse daquilo para se firmar dentro do Universo. Eu apenas fiz meu papel como uma peça de xadrez daquele grande esquema, porque não era de mim que ele precisava. Era de alguma gentileza imóvel, de alguma prova de que ele não fora abandonado pelo Destino.
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Às vezes, era tudo que importava.
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— Você quer comer algo? — eu ofereci, enfim, quando você parecia finalmente ter voltado a si. Seus olhos azuis se abriram e me encararam de volta. — Posso pedir algo, ou, sei lá… acho que tenho pizza congelada no freezer.
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— Não precisa se preocupar… — começou, enquanto eu me afastava, já com meu celular em mãos; e lembrei-me, de repente, do que acontecera com ele na ponte.
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É, talvez tivesse visto sua última ligação. A tela estava toda rachada, e apesar de não ter esperanças de que ele ligasse, a luz acendeu, me surpreendendo.
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Quem diria que a tecnologia não me deixara na mão.
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O touch screen ainda estava um pouco avariado, e certamente me causaria alguns cortes nos dedos se eu não colocasse uma tela de proteção, só que eu não tinha dinheiro algum para consertar aquele estrago. Teria que ficar com aquela porcaria até juntar minhas pobres economias, ou vender alguns desenhos para algum pobre coitado. De qualquer forma, era uma boa notícia que o celular ainda funcionava, mesmo naquele estado lamentável. Eu ainda podia fazer minhas operações de banco, e todos os meus contatos estavam ali. Incluindo… o da pizzaria que eu mais gostava.
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— Não se preocupe — eu respondi; sabia muito bem que poderia economizar acendendo o forno e gastando a pizza congelada, mas aquela era uma ocasião especial. Você não se animava comendo comida congelada. Quem mudava de perspectiva com pizza brotinho? O melhor era mesmo pedir uma pizza fresquinha. — Você paga a próxima.
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— A próxima…? — você repetiu, um tanto incerto, mas então, um sorriso. — Certo então. Combinado.
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Ponto para mim.
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Enquanto mexia no celular, apoiado contra o balcão da cozinha, na tentativa de descobrir o quanto ele funcionava e qual pizza pedir — eu tinha o meu pedido preferido, é claro, mas precisava descobrir o seu —; eu o vi se levantar e ir em minha direção, ainda olhava em volta.
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Eu não tinha muitas coisas. A cama de casal ocupava metade da sala; e, sinceramente, eu poderia ter uma cama de solteiro apenas pelo fato de que ela não via outra pessoa desde o Grande Dilúvio, mas o problema era que, como muitos dos meus móveis, aquela cama era uma doação do último apartamento de Dave. Aquela fora uma herança que eu recebi de seu quarto, assim como a cômoda colorida blocada de sua infância, que guardava as minhas poucas roupas de qualquer jeito; a maioria dos equipamentos de cozinha vieram com o pequeno apartamento. O resto das decorações, no entanto, eram minhas. Fotos espalhadas, peças de arte, quadros diversos, materiais de desenho. Assim como a maioria dos meus trabalhos da faculdade espalhados de qualquer modo pelo chão. Eu também tinha uma pequena mesa de desenho, mas essa se encontrava desmontada, por ocupar muito espaço. Eu realmente só a armava na hora que precisava.
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E no momento…
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— O que você acha de uma pizza margherita…
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Você estava a centímetros de mim. O que era engraçado, um pouco, dada a nossa diferença de altura. Eu não havia reparado nisso na ponte, quando o tive em meus braços, no entanto, você tinha uns bons trinta centímetros a menos do que eu. Bem, com a minha altura, era de se esperar, já que eu reinava nos céus com meus um metro e noventa e quatro centímetros de altura. Mas você era baixinho, não era?
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Será que você era adolescente? Devia ser menor de idade. Céus. Você cheirava a problemas.
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Eu realmente devia ter te levado à delegacia…
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Você assentiu.
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— Será que eu posso tomar um banho?
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Acho que aquela foi a primeira frase inteira que ouvi sua. Sem contar os xingamentos.
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De novo, o rubor tomou conta de seu rosto, e você apenas desviou o olhar. Eu quis clarear as dúvidas.
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— Claro que pode. Eu ofereci pegar uma toalha pra você. Inclusive, pode secar suas roupas na secadora que tem no banheiro… eu ia sugerir isso. Só que acho que pode demorar algum tempo. Quer algumas roupas emprestadas?
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Você olhou para a cômoda e apenas assentiu, cruzou o quarto e a cozinha com apenas algumas passadas para chegar até o banheiro. Aparentemente, eu teria de me acostumar com poucas palavras. Terminei de pedir a pizza e deixei meu celular em cima do balcão. Fui até a cômoda e tirei de lá uma toalha felpuda — a melhor que eu tinha, quase de estimação mesmo —, que, felizmente, estava limpa; e um conjunto de roupas que Dave normalmente usava quando passava a noite no meu apartamento. Imaginei que qualquer roupa minha ficasse muito larga em você, já que minha altura era incompatível com a sua, e quando volvi os olhos no dito cujo…
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Você já estava em frente à porta do banheiro, e se despia.
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Bem, quem estava vermelho agora?
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Eu podia jurar que estava da mesma cor que a raiz dos meus cabelos tingidos.
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Minha mandíbula levemente se abriu até. Eu não conseguia parar de olhar. Eu era um artista por profissão e por natureza. Apesar de ter várias aulas com modelos vivos e conhecer como era a musculatura humana, era uma coisa completamente diferente observar os bíceps e tríceps daquele espécime em específico, que se despia retirando a jaqueta vermelha e a camisa branca por debaixo; os pectorais major e trapézio contraindo e…
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Bem em seu trapezoide, marcado em tinta, estava uma flor.
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Mas eu sabia muito bem qual era sem precisar referenciar o Google ou uma biblioteca.
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— Hortênsias — eu disse.
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— Ah — você suspirou, e segurou suas roupas em mãos.
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Era como um feitiço. Estava bem ali, a tatuagem maldita. Eu queria tocá-la.
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Foi quando notei que você estava apenas de cueca, bem no meio da minha cozinha.
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O embaraço retornou novamente, e eu praticamente joguei a toalha em cima de você, para cobrir suas vergonhas.
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— Aqui! Tome, por favor…
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Se fosse possível, eu diria que você ria de mim, mas meu visitante não riria de tamanha tragédia, não é mesmo? De qualquer forma, você foi em direção ao banheiro e fechou a porta atrás de si, e eu ouvi quando ligou a máquina de secar, e o chuveiro logo em seguida. Eu apenas respirei, aliviado, e me joguei na minha cama.
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Muitas emoções para se lidar de uma vez. Não estava preparado para ter um rapaz se despindo na minha frente daquele modo. Bem, era como Dave planejara que minha noite fosse terminar, no entanto, aparentemente, eu ainda tinha que preparar meu psicológico para ver outra pessoa nua tão de perto.
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Teria você um irmão, ou simplesmente estava acostumado a tirar a roupa com frequência na frente de estranhos?
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Eu não sabia.
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Apenas… eu tinha visto aquela tatuagem antes, no entanto, você não pareceu me reconhecer.
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Não era você meu date no Tinder?
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A pizza chegou no instante que você saiu do banheiro.
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— Voilá — eu disse, satisfeito.
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Paguei o entregador e trouxe a pizza, e sentei-me na cama para aproveitar a delícia. Havia trocado de roupas, e você usava o conjunto improvisado de Dave. Eram apenas uns shorts vermelhos e uma camiseta gráfica de uma banda que nós dois já tínhamos deixado de gostar. O olhar que você dignou à camisa foi cômico.
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— Prometo que tenho um gosto melhor agora. — Indiquei que se sentasse na cama, do lado esquerdo.
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Eu nunca abdicaria do lado em que eu costumava dormir, nem mesmo para Dave. Nem para você.
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— Não estava julgando. — E sorriu.
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Aquilo me fez erguer uma sobrancelha. Era o maior número de palavras que você falara na minha presença. De qualquer modo, era bem-vindo. Pelo modo que seus ombros pareciam relaxados, e a maneira despojada com a qual se sentou na cama, com uma perna na cama e outra tocando no chão; você parecia bem mais à vontade no meu pequeno apartamento.
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Uma boa notícia.
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— Pizza?
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Você assentiu, pegou uma fatia com a mão direita, e comeu em um novo silêncio, mas ficamos próximos. Na outra, segurava, com firmeza, o celular. A caixa da pizza aberta nos separava, porém, em poucos momentos, devoramos o conteúdo; e o cheiro delicioso foi substituído por nossos estômagos cheios.
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Eu me joguei contra o colchão macio, e observei meu companheiro improvável. Havia algo no modo em como a franja loira caía sobre os olhos azuis, firmes e profundos, a atenção presa no acender e apagar de cada mensagem recebida pelo celular. Mas, ao contrário do que eu esperava, não respondia a nenhuma ligação. Apenas encarava a tela.
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— Não vai quebrar se você responder de volta — arrisquei, apoiando a cabeça com uma das mãos, ainda com os olhos centrados nele.
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Você pareceu sair de seu estupor, baixou o braço e colocou o celular no colo.
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— Às vezes, as pessoas só querem expiar a própria culpa — foi sua resposta, enfim.
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— Quer elaborar mais?
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Você ficou alguns momentos em silêncio, mas então, balançou a cabeça negativamente.
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— Prefiro fazer algo mais interessante…
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Havia um ar diferente em seu rosto. Um sorriso. Era isso que eu via de diferente. Era a primeira vez que o via sorrir de canto de boca, um de cafajeste; e droga, lhe caía muito bem. Eu tive que me chutar mentalmente que não o trouxera ali para namorá-lo ou qualquer coisa do tipo. Era só para tirá-lo da chuva. Como um cão abandonado.
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Ou um gato.
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Você se moveu de quatro sobre a cama e andou em minha direção. Achei que fosse se deitar ao meu lado, mas continuou avançando… e avançando…
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Até que seu rosto ficou a centímetros do meu, e suas mãos estavam lado a lado da minha cabeça; eu fiquei sem saber como agir. Não sabia o que aquilo significava, ao menos, não sabia o que eu queria que aquilo significasse.
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Abri a boca para falar algo, mas as palavras não saíram. Meus olhos estavam focados em você, Jesse, especificamente em sua boca…
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Você fechou os olhos, e eu não percebi quando eu fiz o mesmo.
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Seu celular tocou.
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Nós abrimos os olhos.
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— Tsc — disse quando se afastou, mas não antes de piscar um olho. — Você fica adorável vermelho desse jeito, Alex. — E acariciou minha bochecha levemente, antes de voltar a dar atenção ao celular e encarar o visor.
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Quanto a mim… meu coração estava prestes a sair pela boca. Eu nunca tinha sentido algo parecido. Essa animação, esse frio na espinha… essa vontade de sentir a pele do outro na minha. Eu engoli em seco. Quem quer que fosse, você mexia com todos os meus sentidos. Aquela era a primeira pista.
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Por outro lado, ao voltar a olhar o celular, seus ombros se tencionaram. Recebera alguma notícia ruim. Ergui meu torso, e fiquei sentado na cama. Dava para ver as lágrimas que ele se recusava a derramar. Você, Jesse, acima de tudo, era orgulhoso. Aquela foi a segunda pista.
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— Tudo bem?
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Você voltou a me encarar, e eu entendi que não sabia responder aquela pergunta.
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Eu cobri a mão que segurava o celular, e a apertei um pouco.
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— Vai ficar tudo bem. Vamos dormir. Amanhã é um novo dia.
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Tirei o celular de suas mãos, o coloquei ao lado do meu, e os deixei para que carregassem, de forma silenciosa, em cima da cômoda. Seu silêncio perdurou comigo, contudo, eu parecia ter feito algo certo, porque apenas assentiu e murmurou em uma voz baixa:
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— Obrigado.
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— Vamos mesmo dormir na mesma cama?
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— Você vê outra opção por aqui?
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Não era como se tivéssemos outra escolha. A outra opção seria um dos dois dormir no chão da cozinha, com algum dos lençóis servindo de colchão improvisado, mas eu tinha uma alma de velho em um corpo de um jovem de vinte e três anos; e você era visita.
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Além do mais, era um pedido.
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— Não quero me impor…
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— Oras, claro que pode. — Eu dei de ombros, e me livrei de qualquer modo da caixa de pizza. Eu ainda iria tirar o lixo para fora, mas já estava tarde, então iria acordar cedo no dia seguinte, antes que o caminhão passasse para tirar todo o lixo da casa. — Você também pode ser mimado um pouco, Jesse.
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Eu não percebi o quanto minhas palavras o afetaram, mas o sorriso que deu era verdadeiramente genuíno. Você subiu na cama, se deitou e cobriu-se com as cobertas; eu o segui, e apaguei as luzes em seguida.
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Deitei-me de lado, de as costas para ele, para que tivesse mais alguma privacidade, embora não fosse a forma que costumasse dormir, então era desconfortável para mim. O que importava era que você ficasse bem, não era? O silêncio reinou entre nós, e eu esperava que ele tivesse um boa noite de sono. Eu mesmo sofria um pouco de insônia, portanto, encarei os celulares em cima da cômoda.
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A tela dele acendia com cada nova mensagem, com cada nova vibração, até que simplesmente apagou por volta das três da manhã.
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Acho que desistiu, foi o que pensei. Mas quem mandaria mensagens tão insistentes, quando você mesmo, Jesse, afirmou que não tinha lugar para retornar? Quando falou que não tinha família, ou amigos…
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Podia ter brigado com alguém. Claramente tinha brigado com alguém, pelo ferimento no rosto. Talvez tenha sido por isso o motivo do comentário da “consciência pesada”. Eram provas de que acontecera algo com você.
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Bem, isso e estar no meio de uma ponte no meio do nada, fazendo Deus sabe o quê…
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Decidi perguntar a você quando acordasse na manhã seguinte. Talvez uma conversa mais séria fosse necessária, descobrir o que faria a partir dali. Precisava de acompanhamento sério psicológico, de um médico para ver aquele ferimento no rosto, de uma conversa com a família…
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Se tivesse família.
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Quando o sono começava a tomar conta de mim, senti duas mãos tocarem minhas costas e puxarem de leve minha camisa. Quase não senti o toque, tão necessitado, tão desesperado, tão quieto…
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— Jesse?
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Você não disse nada, mas virei meu rosto em sua direção. Você percebeu a minha movimentação e colocou o rosto contra mim, e, finalmente, senti a umidade. Suas lágrimas, um sacrifício para o altar em minhas costas.
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— Jesse…
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— Não se vire.
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Você se agarrou com desespero contra mim, e era um encaixe perfeito com meu corpo. Como se fossemos duas peças de dois quebra-cabeças diferentes, mas feitos da mesma forma. Tínhamos o mesmo formato. Os mesmos problemas.
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Apenas não sabíamos daquilo.
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— Deixe sair — eu disse, ainda não ousava me mexer. — Deixe tudo sair.
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E você apenas chorou. Não disse uma palavra, não soltou um som. Apenas o choro gutural de sentimentos presos no peito, de uma vida inteira de não os expressar.
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Por fim, não foi a tristeza que o alcançou, e sim o cansaço. Quando finalmente dormiu, eu ainda demorei algum tempo observando suas feições e com pensamentos diversos. Memórias. Estava prestes a me afogar nelas quando o sono me atingiu.
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Até mesmo o deus do sono era gentil.
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Quando acordei, os lençóis estavam revirados, porém, eu me senti estranhamente com frio. Estava com preguiça de abrir os olhos, mesmo assim, precisava me levantar, para jogar o lixo do lado de fora; e foi então que percebi…
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Estava sozinho na cama.
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Ergui-me de repente, no susto. Olhei ao redor, e como o apartamento era pequeno, foi fácil constatar a verdade que me assombrava:
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Você foi embora.
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