capítulo 8
dor de amor
Nenhum dos dois soube quem se moveu primeiro. Mas esperamos o Sol nascer, como se o novo dia fosse renovar as esperanças, e apagar as palavras da noite anterior. A tempestade em minha mente estava acalmada, mas o rastro de um meteoro ainda ousou sair.
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— Alex, eu não acho que Dave estava mentindo.
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Ele assentiu. Talvez ele estivesse pensando nisso a noite toda. Talvez, a vida inteira.
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— Vou conversar com ele. Não se preocupe. Você já tem problemas demais, Jesse.
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E ele afagou meus cabelos quando pousamos de volta ao número vinte e quatro da rua das Margaridas. Nosso voo tivera curta duração; o orvalho da manhã caía sobre a relva e entrava em meu corpo em pequenas adagas a cada centímetro de minha pele que não mais tinha contato com a de Alex. Todas as funções aprendidas com custo na infância, esquecidas uma vez que ele estivesse por perto. Até minha respiração se tornava um ofegar fraco e singelo. Eu o olhava. E esperava.
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Meus lábios formigavam e esperavam.
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Ele me notou. O Sol irradiou sobre seu olhar, o verde brilhando com intensidade sob o nascer e iluminando em todas as cores, branco. E eu soube. Naquele momento, eu soube. E esperei.
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Ele veio até mim, e minha respiração ofegante falhou quando seus lábios vieram…
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E encostaram-se em minha testa, em um toque singelo.
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Simples.
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Eu fechei os olhos e tentei me concentrar naquilo. Era mais do que eu merecia. Era muito mais íntimo do que eu merecia. E, por hora, bastava. O sorriso que ele me dirigiu, meio tímido, meio corado, bastava.
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Céus, ele valia a pena.
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Alex era o suficiente.
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interlúdio
Seu olhar era infinito. O meu, repleto de cinzas. Sua voz estava na ponte de novo. Estávamos andando e, de repente, seus braços escorregaram de meus dedos, e eu corri. Corri por léguas, por milhas, por quilômetros. Corri até não ter mais fôlego, e foi só quando agarrei sua mão que me dei conta de mim.
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— Você me segurou, Alex.
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Sua voz me trouxe de volta, com o toque frio de sua mão.
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— Você não me deixou cair — repetiu. — Eu estou vivo.
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Estava?
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Então por que as flores no meu peito não morriam? Por que cada respiração cortava a minha garganta e tornava tão difícil de te encarar? Minha visão marejava, e você se tornava ondas de novo, e de novo; você caía.
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Eu não soube quem disse:
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— Você quer continuar?
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Olhei em seus olhos. Por um momento, os atravessei. E por fim:
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— Sim.
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— A foda foi boa, huh?
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Não seriam as provocações de Dave que acabariam com meu bom humor. Depois que saímos do quarto, descemos as escadas e encontramos um Dave ainda sentado no sofá, com as pernas cruzadas, e dormindo com o controle em mãos, o videogame ainda ligado. Eu sugeri, brevemente, tirar uma foto, mas Alex apenas riu e o acordou. Dave parecia agitado desde então.
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Ainda estava cedo, e como nossa última refeição havia sido pipoca e doces, Alex se ofereceu para fazer algumas panquecas com ovos e bacon para comermos com xarope de bordô, que havia aparecido misteriosamente durante a noite.
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Eu e Dave sentamos lado a lado nas banquetas da ilha no meio da cozinha. Os únicos sons eram do óleo chiando contra a carne e do tec tec frenético dos dedos de Dave sobre as teclas do celular. Meu olhar não deixava as costas largas de Alex quando o escritor ao meu lado finalmente gritou:
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— Minha boa Senhora dos Sete Pecados, por favor, me crucifique agora mesmo.
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Alex se virou no mesmo instante, sem saber o que fazer, a frigideira cheia de óleo ainda em punho. Eu arqueei uma sobrancelha, curioso. Eu notei que ele digitava algo em fúria, mas imaginei que fosse algo como uma história, ou algo parecido. Percebi logo de imediato que se tratava de um aplicativo de conversa. Um que eu utilizava muito para falar com…
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Ah, por falar nisso. Eu ignorei meu telefone por tempo demais. Peguei o aparelho e lá estava o que eu imaginara: várias e várias mensagens, todas do mesmo número. Algumas de minha irmã, mas a maioria da madrugada eram de Kurt. Bêbado e querendo uma foda com certeza. Apenas vislumbrei algumas dela para ver seu conteúdo.
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Meh. Outra hora lidaria com isso. Minha noite havia sido infinitamente melhor do que seria se eu tivesse ido.
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— O que foi, Dave? — Alex conseguiu desligar o fogo e colocar tudo em ordem antes de lidar com aquele incêndio em particular.
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Já Dave era incapaz de formar uma fala coerente.
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— Aaaaaaaaaaaaaerghhh — foi o grito gutural que escapou da garganta dele. Ele abaixou a cabeça, deixou o celular em cima da bancada, e colocou as mãos sobre o couro cabeludo.
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— Dave, não se machuque — Alex alertou. — Você já não tem muito cabelo, pra começar.
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Só que o aviso pareceu deixá-lo pior.
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— Ai, não, agora vou ficar ainda mais feio… como vou sair assim?
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— Ir para onde, Dave?
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Alex colocou as mãos sobre seus ombros, e imediatamente um vento frio soprou na cozinha. Mordi meu lábio inferior e tentei me concentrar em outra coisa. Passei o olhar pelas mensagens de Kurt de novo, pensando em como respondê-lo.
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— Samuel me chamou para sair…
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— Num encontro?! — A felicidade de Alex era genuína, se derramava em sua voz.
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— Não. Bem, talvez. Ele perguntou se eu iria na reunião do grupo de escrita dele… disse que eles ficam acordados a noite inteira escrevendo. É um dos principais eventos do mês. Eu nunca participei de nada parecido…
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— Mas você não gostaria de ir?
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Eu não reconhecia a minha voz. Meus olhos só estavam voltados para as mãos de Alex. As mãos de Alex sobre os ombros de Dave, o contato. Dave tremendo. Alex o segurando.
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Por que ele estava o segurando?
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— Claro que quero ir… estou dois terços na escrita do meu livro… acho que seria um bom incentivo.
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Alex soltou uma risada, e liberou meu coração ao largar os ombros dele e voltar para a comida.
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— Claro que passar a noite junto do seu namoradinho é a ideia máxima de um encontro romântico para Dave.
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— Nem todos podem passar uma noite inteira abraçadinhos fazendo chucuchucu com seus amorzinhos. — Ele fez um muxoxo. — Eu quero passar mais tempo com ele, mas isso significa passar mais tempo com um monte de gente desconhecida também.
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— Você não os conhece da internet?
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— Conheço. Mas não é a mesma coisa, né?
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— Não é? — Eu dei de ombros. — Eu encontro estranhos da internet o tempo todo.
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Alex me dirigiu um olhar cheio de ciúmes e surpresa.
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— Por causa do trabalho — apressei em responder.
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Não sabia porque tive que complementar aquela resposta com uma meia-verdade. Era por causa do trabalho. Mas, na maior parte das vezes, não acabávamos em negócios, e sim na cama. Não era algo que ele precisava saber.
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Ficamos em silêncio por tanto tempo que nem reparei que Alex finalizou as panquecas, e o cheiro doce penetrou todo o meu ser.
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— Bem, está decidido.
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— Como assim? Eu irei?
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— O que devemos fazer. Jesse, acho que temos um encontro esse final de semana também.
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— Quê?!
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— Dave, como participamos desse tal encontro com o grupo de escrita?
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— Vocês querem mesmo?
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— Lógico. — Brinquei. — Alguém tem que ser seu coach de namoro.
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— Fale isso pro seu namorado.
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— Eu sempre falo as coisas pro Alex.
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— Então ele já é seu namorado? — Meu irmão invadiu a cozinha. — Que bom, porque o cheiro é espetacular. Se for para acordar todos os dias assim, eu aprovo o relacionamento.
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Meu rosto dizia tudo, e apesar das risadas direcionadas a minha pessoa, apenas busquei a mão de Alex sobre o balcão; dessa vez, ele a aceitou, e sorriu discretamente.
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Então estava tudo bem entre nós, e era aquilo que importava.
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Acontece que arranjar ingressos para o evento não era uma tarefa tão fácil assim, especialmente de última hora. Foram necessárias algumas ligações da parte de Alex para o tal Samuel; e embora o nervosismo de Dave fosse perceptível, sua animação também o era. Conforme quanto mais a data se aproximava, mais ele tremia.
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Quanto a mim e Alex…
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Se eu achei que algo houvesse mudado naquela noite em especial, Alex não o disse, e nem eu. Nunca soube se Alex tinha trocado palavras com Dave sobre o que ele havia me dito. E, no fim, aquela ferida permanecia, e se infectava como uma ideia.
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Apesar do encontro com o grupo de escrita ser apenas na última semana do mês, meus encontros com Alex foram espaçados. Não por culpa dele necessariamente, mas sim devido a grande quantidade de trabalhos da faculdade, ao ponto que até eu passara a recusar dormir na casa dele, devido ao cansaço; porque quando íamos para sua casa, dormir era a última das preocupações. Alex também passou algumas noites dormindo na casa de Dave, pela ansiedade; e fui convidado em algumas ocasiões para dormir lá também, mas… não me sentia confortável assim.
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Enfim.
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Não adiantava ficar pensando naquilo quando eu tinha um encontro para ir. Alex me chamou para um café apertado, próximo da faculdade, porque, mesmo com os trabalhos, ele queria me ver. Achei fofo, e tentei ignorar como meu coração reagia ao ver que, apesar de tudo, Alex se importava comigo.
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Era algo bom.
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Não sabia exatamente o quão bom, mas era um quentinho no meu peito.
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— Vai sair de novo? — A voz gelou meus sentidos, e eu sofri uma hipotermia. Não a encarei, porém, não sabia como não tinha ouvido os passos pesados do salto alto. Nama também iria sair. — Você não acabou de voltar do trabalho?
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— Hm.
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— Pelo amor de Deus, Jesse. — A voz dela, decepcionada, e eu com minha vontade de fugir. Amarrei os sapatos de novo, apenas para não encará-la. — Juro que não sei o que você quer da vida, desperdiçando seu tempo dessa forma. Antes de procurar uma namorada, procure melhorar você mesmo…
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Antes que o sermão continuasse, eu me levantei bruscamente e fui em direção à porta.
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— Jesse, antes que vá — Nama me chamou —, preciso conversar com você amanhã. Por favor, volte para casa hoje e não saia mais. É um sábado, então você não tem trabalho, né?
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— Hm.
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E antes que ela reclamasse ainda mais, eu saí porta afora; corri em direção ao ponto de ônibus, e ultrapassei meus pensamentos de buraco negro. Corri tanto, e ao ver que o ônibus não vinha, meu instinto reagiu antes; e me vi correr, a respiração esbaforida; e quando vi as luzes vermelhas do neon da faculdade, apenas parei quando vi meu Sol.
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Alex me esperava na porta, e parecia surpreso.
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— Achei que fosse demorar mais. — Ele sorriu, e eu soube, então, que tudo ficaria bem. Me joguei em seus braços e, mais uma vez, me esqueci de quem era.
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— Posso dormir na sua casa hoje? — a pergunta escapou dos meus lábios uma vez que entramos e pedimos nossos drinks.
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Alex, um milkshake de Ovomaltine, e eu, uma água e um café expresso; a água foi devorada de imediato. Alex corou um pouco, mas apenas apertou seu enlace.
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— Tudo bem, você é sempre bem-vindo lá. Mas… estava pensando em outro programa para amanhã.
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— O quê? — Mexi com a colher no meu expresso, vendo o chantili se derrete.
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— Quer ir ao cinema?
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Meu primeiro pensamento foi
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nama
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o gosto de alex
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E não era difícil saber qual eu preferia. Não havia compromisso algum que me fizesse perder aquele encontro.
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— Claro, ruivinho.
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A noite veio, e, mais uma vez, nossos corpos descansavam sobre a cama, nossas respirações se confundiam com o ar frio. Minhas pálpebras caíram, sonolentas, sobre meus olhos, especialmente pelo toque de Alex rítmico em minhas costas, traçando seus contornos e relevos. A cicatriz por debaixo era menos perceptível, mas ainda estava lá.
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— Qual é o motivo da tatuagem?
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— Hm? Motivo nenhum.
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— É muito lindo o desenho.
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Eu soltei uma risada baixa, e virei o corpo para voltar a encará-lo.
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— Por que você é fascinado pela minha tatuagem?
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— Eu gosto de hortênsias, a flor, eu digo.
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— Você gosta de flores?
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— Pode se dizer que sim…
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E seu olhar caiu sobre minha boca, esperando o beijo que veio cálido em seguida. Meu gelo se derreteu contra seu fogo, e me abri novamente contra ele, sentia seu toque, faminto e sedento. O beijo durou mais alguns segundos, me incendiando, quando Alex o interrompeu e me encarou, antes de se levantar da cama e começar a procurar suas roupas.
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— Venha. Eu quero te mostrar algo.
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— Vamos sair? Olha a hora, Alex.
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— Não é muito longe. Prometo.
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Pensei em reclamar, mas… o olhar determinado dele me faria fazer qualquer coisa. Eu me vesti e coloquei um dos seus casacos, sem o fechar; enquanto Alex saiu apenas com um suéter. Calçamos nossos sapatos, mas perdi a coragem quando ele abriu a porta.
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— Sério, Alex, prefiro muito mais ficar dentro de casa. Está muito frio!
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— Só alguns minutos. Prometo.
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Revirei os olhos e saí. Ao invés de irmos para a rua principal, Alex seguiu um caminho para dentro da cerca viva, que estava mais para morta por causa do frio. Ele tirou uma das chaves e abriu a porta do quintal da casa. Ele tinha me contado que o quintal era um terreno em comum dos três apartamentos, mas Alex nunca me contara o que tinha nele. Achei que era apenas um jardim comum.
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Quando a porta se abriu, achei que o tempo passara mais rápido — porque, no inverno que se iniciava, íamos para a mais bela primavera.
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O jardim tinha alguns arbustos, apesar das flores morrerem por causa da temperatura, no entanto, o espetáculo de tons de azul, rosa e branco floresciam a despeito do clima. Contra o céu negro das folhas da noite, parecia que tinha uma verdadeira galáxia entre nós, não longe, mas a meros passos de distância.
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— Não valeu a pena?
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— Como…
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— Eu não sei direito. Nunca vi essas hortênsias morrerem, mas desde que me mudei, eu cuido delas. É um dos pequenos milagres da natureza, acho. E você não questiona milagres de verdade.
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Alex me abraçou, e eu senti seu calor através das roupas; apenas paramos e admiramos a paisagem. Ele fechou os olhos e encostou seu rosto contra meu pescoço, aspirando a minha essência. Eu apenas sentia o toque em minha tatuagem, pensativo.
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Ele notara as cicatrizes. Sabia que havia uma história — Alex não passara tanto tempo admirando a minha tatuagem sem notar o que ela escondia. Eu não queria contar, porque eu não gostava de lembrar, mas… na hora, quis revelar-lhe meu segredo — de que meu pai era bruto, que sua ideia de filho perfeito era um patamar inalcançável e de todas as suas tentativas de tirar a homossexualidade de mim na base de cinto, a dor da libação
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eu vi você cair
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E eu quis sim contar-lhe, algo tão íntimo meu, que as cicatrizes debaixo das hortênsias continham as raízes do meu problema; porque se não tivesse seguido aquela luz, talvez estivesse morto, e talvez tivesse sido melhor.
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Mas não consegui. Não agora, com meus sentimentos tão revirados e incertos. Eu apenas me virei para Alex e o beijei de novo, entregando-lhe todas as dúvidas do meu coração e esperando alguma resposta que nunca viria.
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Perdidos no espaço um do outro.
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Saímos para o cinema, e pegamos o metrô dessa vez, para chegar até a estação em que o shopping se localizava. Estava um pouco cheio, então fiquei de pé, mas Alex conseguiu um lugar para sentar, e tirara o caderno — o mesmo que usava para me desenhar — e começou a esboçar algumas pessoas do vagão em que estávamos.
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— Não vai me desenhar? — provoquei.
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— Não posso.
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— Por quê?
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— Meu professor reclamou que eu só tinha uma pessoa no caderno inteiro, e o objetivo do exercício era preencher o caderno com pessoas diferentes, para conhecer tipos de corpos diferentes.
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— Entendo… mas o exercício não era para semana passada?
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Ele deu de ombros, sem querer continuar a falar.
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— Alex…
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— Ele me deu um tempo a mais.
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— E a nota, não?
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Alex deu de ombros de novo, e eu suspirei.
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— Alex…
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— Não se preocupe, sério. Eu ainda vou passar nessa matéria.
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— E quanto a sua bolsa?
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— Evito pensar em problemas até que eles se tornem um problema de fato.
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— Não parece bom, evitar pensar em algo.
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— As coisas eventualmente se resolvem. Agora… — Ele guardou o caderno na bolsa, e segurou na minha cintura, me fixando mais ao chão. — Vamos pensar apenas no cinema, ok? Que filme quer ver?
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— Qualquer um está bom. De preferência uma sala sem muita gente…
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— Jesse.
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— Você gostou da última vez.
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— Eu prefiro evitar ser preso por desacato.
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— Qualquer um está bom, então. Pode escolher.
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Os olhos dele brilharam.
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— Bem, tem esse filme…
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E ele continuou a falar sobre a premissa do filme durante todo o trajeto de metrô e caminhando, eu apenas seguia fragmentos. Era o tipo cult que eu não costumava me interessar, no entanto, se Alex ficaria feliz…
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Entramos no cinema, e não estava cheio, mas tinha pessoas o suficiente para que eu não pudesse ocupar minha boca com outra coisa a não ser a pipoca que comprara para nós dois. Alex ficou completamente fascinado com a história e, em algum momento, vi até lágrimas se formarem em seus olhos. Eu estava cansado, e passados trinta minutos — que pareciam uma hora inteira —, eu terminei meu refrigerante e resolvi me levantar.
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— Vou comprar mais comida — avisei a Alex, que apenas me encarou, assentindo. — Volto daqui a pouco.
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Andei pelos caminhos internos do cinema, e apesar de ser sexta, por causa do horário, tinham poucas pessoas andando por aí. Decidi ir ao banheiro antes de ir comprar o refrigerante — o contrário talvez fosse um pouco nojento. Quando estava lavando as mãos, senti uma presença perto, e um homem, talvez nos seus trinta anos, se aproximou lavando as mãos na pia ao lado da minha, sendo que éramos os únicos no cinema.
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— E aí, gatinho.
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Eu revirei os olhos, mas… estava entediado. Era tão ruim assim flertar um pouco?
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— E aí, bonitão.
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— Sozinho?
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— Você está aqui, não está? — Ofereci meu melhor sozinho. — Não posso dizer que estou sozinho dessa maneira.
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— Entediado?
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— Algo assim.
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— Posso te mostrar uma coisa muito divertida…
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— Hm.
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— Não vai não.
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Antes que eu pudesse responder, a voz de Alex ecoou pelo banheiro. Eu nunca tinha o visto tão irritado — em geral, Alex controlava as suas emoções —, e até mesmo a raiva que sentira com seu colega de faculdade não parecia tão séria quanto ali. Alex avançou indo em minha direção, e ficou na minha frente contra o outro homem.
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— Eh… não sabia que o gatinho tem dono.
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— Ele tem. Pode ir saindo antes que apanhe.
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O outro homem olhou para mim, e eu apenas dei de ombros. Ele parecia muito pior sob aquela luz, e eu não dava para covardes. O homem saiu, e Alex se virou para mim.
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— Você está bem?
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Assenti, e ele me abraçou, se agarrando contra meu corpo. Sua voz saiu baixa e rouca.
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— Você é meu.
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— Não sabia que era tão ciumento.
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— Jesse, não me provoque.
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— O que vai acontecer comigo se continuar?
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— Eu… — Ele baixou o tom, rosnando contra a minha orelha. — Eu vou ter que te punir, Jesse.
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— Hm… isso só me dá mais vontade de continuar…
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— Idiota.
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Mas o abracei, e o fiz se curvar contra mim enquanto ficava na ponta do pé para beijá-lo.
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— Estou aqui, Alex. E não vou embora com ninguém além de você.
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— Melhor mesmo. — Ele bufou, e me pressionou contra o balcão. — Céus, que susto você sumir assim… não faça mais isso comigo.
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Apenas o abracei, não sabia o que responder. Era óbvio que ele tinha algum trauma, mas… eu não sabia o que responder, porque meu coração orbitava de felicidade ao ouvir aquelas palavras. Não que eu quisesse pertencer a alguém, contudo, a perspectiva de Alex me querer tanto assim… era um pouco lisonjeiro até. Eu ofereci meu pescoço para ele e disse:
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— Me marque como seu então.
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E o beijo de Alex foi intenso, me fazendo gemer contra seu quadril, enquanto a marca vermelha, que o espelho refletia, era parte do quadro da minha pele cheia de roxos, verdes e azuis, todos criados por seus lábios.
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— Vamos voltar? — ele ofereceu, depois de terminar.
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— Sim, eu ainda quero comprar algo, no entanto.
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— Podemos ir embora.
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— Ué, você não queria ver?
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— Você não está entediado? — Desistindo, eu confirmei. Ele tomou a minha mão e me guiou para fora do banheiro. — Vamos dar uma volta no shopping então.
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Eu assenti, sorrindo, enquanto tomávamos sorvete —
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é inverno, Alex,
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é mais gostoso assim, Jesse
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—,nós dois ligados pelo calor de nossas mãos.
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Quando o dia chegou, eu simplesmente dormi até o horário de sair para me encontrar com Alex e Dave. Iriamos nos encontrar no apartamento de Alex, e, de lá, partiríamos para a biblioteca pública em que o evento ocorreria. Não estava levando nada demais. Alex levaria lanches e cobertores. Dave disse que levaria “sua mente afiada e um livro para acabar”. Eu e Alex ficaríamos com a parte da comida e apoio moral. Seria uma noite diferente.
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Peguei meu celular que estava na mesinha ao lado na minha cama, carregando. Mais mensagens.
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Kurt: Pare de me ignorar, puta.
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E, às vezes, eu só queria ignorar que a minha vida existia.
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Não respondi, mas outra mensagem inoportuna apareceu em forma de uma batida na porta. Essa, infelizmente, eu não iria conseguir ignorar se eu quisesse sair ainda a tempo de não me atrasar.
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— Jesse?
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— Hm.
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A porta se abriu, e meu gêmeo, com um ar encolhido, entrou. Era estranho. Um dia, eu já havia achado que nós éramos o espelho da mesma pessoa. Nós tínhamos as mesmas piadas internas, um alfabeto só nosso. Aí, quanto tudo aconteceu, e nos separamos, eu nunca soube me situar. Como um asteroide saindo da órbita do planeta. Eu e Chase não tínhamos mais coisas em comum. Eu nem sabia mais o que ele gostava ou não. E ele não sabia de nada da minha vida. Francamente, ele poderia passar anos sem falar comigo e seria a mesma coisa. A mesma frieza, a mesma distância. Não sabia se teria resultado.
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— Oi. — Ele olhou em volta. O quarto dele tinha o mesmo tamanho, senão, um pouquinho maior, porque tinha um banheiro suíte. Eu que tinha ficado com o banheiro do corredor porque vim depois. — Eu queria falar com você.
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— Ninguém está te impedindo de falar as coisas para o ar.
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— Ah… — Ele suspirou. — Por favor, não torne as coisas mais difíceis do que elas já são.
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Eu não queria tornar as coisas difíceis, mas eu simplesmente não sabia como lidar. Chase olhou ao redor. Meu quarto era vazio. Não era como se eu não tivesse coisas, só que a maioria delas não estava ali naquela casa. E não era como se eu pudesse reavê-las. E nem queria mais, a essa altura do campeonato. Era como se não fossem mais minhas.
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— Eu queria conversar com você.
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— De novo, você pode falar pro ar. Fale rápido, eu tenho horário para sair.
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Ele revirou os olhos.
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— Você recebeu o recado de Hayley?
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Em algum momento, eu tinha. Mas não tinha registrado, porque, pior do que lidar com meu irmão gêmeo, era lidar com a minha meia-irmã. Porque isso significava que quem estava por trás era…
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— Eu só queria avisar que eu não irei passar o Natal com eles.
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E aquilo era definitivo, afinal.
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— Bem, bom pra você.
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— Você vai?
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Aquilo era uma pergunta difícil. Respondi da melhor forma que eu sabia.
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Dei de ombros.
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Chase revirou os olhos de novo. Ele veio com passos pesados até a minha cama, onde eu não havia me levantado, e ignorava olhar para meu reflexo aquele tempo todo. Sentou-se ao meu lado e falou, com as palavras emborcadas:
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— Eu sei que não estamos bem…, mas eu queria dizer algo pra você.
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Não respondi. Porque o ar pesado da ciência do que viria apertou meu peito e prendeu meu fôlego, e eu sabia. Antes mesmo que ele abrisse a boca, eu sabia que palavras viriam de sua boca.
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— Mitch… Mitchell. — Ele pigarreou. — Ele me pediu em namoro.
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O quarto implodiu quando eu pisquei os olhos. De repente, Chase estava ali, e eu não estava. Estava no vácuo, e tinha me tornado uma supernova. Meu interior sugava a tudo, a mesa, a cadeira, meu notebook. Todas as letras do teclado voavam pelo ar; e o sorriso tímido de Chase me encorajava a afundar na sensação de morte. Por um milésimo de segundo, eu desapareci, e não era eu mesmo. Eu havia morrido.
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E, quando o segundo passou, e voltei para a realidade,
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meu irmão sorrindo
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beijos trocados durante a madrugada
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uma promessa
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um sorriso tímido
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eu tive de dizer:
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— Que bom para você, Chase.
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Não sabia se existia algo parecido com um tornado na galáxia, mas me movia com forças que não sabia existir dentro de mim. Meus tênis desamarrados me levaram para longe, e eu sabia
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(eu vi).
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Era como se gotas de chuvas caíssem em meus ombros e o frio penetrasse meus poros. A casa de Kurt era ali por perto… logo depois da…
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(eu vi você cair)
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— Você demorou, Jesse!
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Ainda era novembro, porém, foi como se uma aura mágica e quente de maio soprasse vida em meus pulmões. Olhei para o lado, para quem me chamava, e a vi novamente. Aquela pequena luz. E meus pulmões se encheram de primavera.
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Meu olhar se abaixou, envergonhado. Alex estava sentado nas escadas da sua casa, um cigarro em suas mãos. Devia estar esperando há algum tempo. Eu mal me recordava que tínhamos planos, mas bastou vê-lo e minhas pernas souberam para onde ir. Não era para a casa de Kurt que elas me guiavam.
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Era ali. Naquele pequeno apartamento.
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Fiquei frente a frente com Alex.
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— Vamos, que cara é essa? — E ele sorriu. Passou o braço pelos meus ombros, aquecendo-os. — Nossa, você está gelado!
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— Está frio. — Dei de ombros. Tentava mais do que tudo conter os calafrios, a tormenta, o tornado.
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— Você não trouxe uma jaqueta?
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Ah. Na minha falta de memória, eu saíra de casa na pressa e nem vestira um casaco ou algo do tipo. Era por isso que eu estava prestes a tremer e passar por calafrios. Bem. Eu nem estava sentindo alguma coisa de qualquer forma. O frio era melhor do que sentir esse peso na minha consciência e coração.
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— Eu dormi demais. — Foi a minha desculpa final.
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Alex me encarou e, por um momento, temi que ele fosse perguntar mais alguma coisa. Porém, ele simplesmente virou-se, entrou em seu apartamento, foi para o amontoado de roupas que ele chamava de guarda-roupa; e tirou um suéter laranja e felpudo.
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— Se você não se importar, eu acho que vai ficar mais frio mais tarde…
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Era no mínimo dois tamanhos maior, no entanto, uma vez que passei minha cabeça pelo buraco, eu me senti um pouco melhor. Porque o suéter não tinha um mau-cheiro. Tinha exatamente o cheiro de todas as coisas de Alex: tinta guache, um odor de desodorante masculino e do xampu que ele usava. E quando ele segurou minha mão ao sair do apartamento, para que pudéssemos buscar Dave, eu me senti um pouco mais aquecido.
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Não estava tudo bem, mas não estava tudo mal também.
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— Vamos, ainda temos que pegar Dave. Ele já está me enchendo o saco mandando mil mensagens e querendo desistir de ir.
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— Precisamos forçá-lo então. — Com as mãos dele em meus ombros, me aquecendo, era fácil voltar a sorrir.
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Os problemas pareciam tão menores. E quando ele pegou minha mão, envolvendo-a com a sua, eu sabia que, talvez, as coisas ficariam bem.
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— Isso aqui é caótico, né. — Foi meu comentário ao chegarmos.
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O local era uma biblioteca pequena, com uma pequena livraria acoplada. Havia várias mesas para leitura, que eram ocupadas por várias pessoas usando os mais diversos tipos de roupas: desde pijamas de zebra, passando por conjuntos inteiros de cosplay de She-Ra; e até uma pessoa, que parecia estar organizando tudo, em um traje de gala. Todos estavam com notebooks, embora alguns carregassem cadernos debaixo do braço para cima e para baixo. O que tinham em comum, no entanto, era o tom de desespero em seus rostos.
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— Tenho certeza de que encontraremos Samuel. — Alex parecia empolgado. Ele agora estava de mãos dadas com Dave, como de costume, mas o rapaz parara alguns passos atrás, a franja lavanda cobria os olhos baixos. — Dave?
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A resposta saiu murmurada, e, especialmente em lugar tão barulhento, eu mal entendi o grunhido que Dave deu. Como eu era quase da sua altura, conseguia enxergar seu rosto vermelho e cheio, com os olhos fechados. A mão dele estava fechada com força ao redor da de Alex. As duas tremiam, e eu suspirei. Realmente, deveria ser difícil para Alex lidar com Dave o tempo todo. Alex se virou para Dave e colocou a mão sobre sua cabeça. O carinho cortou minha respiração, e acalmou a dele, que abriu os olhos.
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— Eu estou bem — outro murmúrio.
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— Então vamos? — Ele abriu um sorriso gentil, daqueles que só dirigia a ele, e engoli em seco, a saliva afundando em meu estômago e revirando-o.
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Eram essas pequenas coisas. Como pedras se acumulando em um lago. Eu fingia não notar.
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E então ele sorria para mim, e ficava tudo bem.
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Alex gemeu um pouco.
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— Tudo bem? — perguntei.
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— Tudo sim. É só uma leve dor de cabeça. Nada demais.
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Eu acenei, e Alex tomou a dianteira, seguido de Dave. Eu os seguia com os olhos atentos às costas do mais alto. Seria muito melhor se tivéssemos ficado no apartamento. Ou se eu tivesse ido para a casa de Kurt. Acho que tinha sido um erro ter vindo para um espaço com tanta gente, mas já estávamos ali. E, no final, era a noite de Dave. Não podia estragar tudo. Era só fingir ser uma pessoa normal por doze horas. O quão difícil era uma missão daquelas afinal de contas?
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Muito, aparentemente.
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Encontramos Samuel em uma mesa relativamente vazia, porque tinha exatamente três espaços vazios que ele reservara para nós. Ele era muito diferente sem o uniforme do café da universidade. Seus cabelos lisos e pretos estavam jogados para trás e uma capa puída e cheia de pelos brancos, além de uma camisa social.
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— Qual a ocasião? — Alex apontou para o figurino.
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— Meu livro é de vampiro. Uma coisa meio Anne Rice encontra Círculo de Fogo.
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— Com gays, né? — Dave riu.
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— Por isso vai ser o maior sucesso.
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Foi naquele momento que percebi que não fazia a menor ideia do que Dave estava escrevendo. Ele não trouxe um notebook, como a maioria das pessoas, e sim um caderno pesado, cheio de anotações e uma caligrafia pesada e miúda. Virei-me para Alex, e ele deu de ombros. Acho que ele também não havia lido.
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— Dave nunca compartilha o que escreve.
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— Ainda não está pronto! — ele grunhiu.
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— Nunca vai estar pronto se você não terminar.
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— Bem, hoje é a noite do intensivão. Se você não for hoje, já era. — Samuel riu, mas consegui notar que as mãos de Dave agarraram as de Alex com mais força.
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Estava doendo. Por que será que Alex não reclamava? Por que aguentava tudo calado?
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Meus pensamentos estavam em um turbilhão enquanto nós nos sentávamos, e eu, ao mesmo tempo que observei a conversa, era como se fosse um zumbido alto em meus ouvidos, indistinto e distante, mas que ecoava. Eu não estava ali. Estava no espaço. Estava embaixo de cobertas, com mãos dadas, e beijos trocados. E como um astronauta perdido na galáxia, eu comecei a sufocar.
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— Jesse?
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Olhei para o ruivo e não o reconheci. Eu não conhecia nenhuma das pessoas ali. Minha respiração estava pesada e minha visão turva. Tudo em meu ser gritava, mas no espaço não há eco. Ninguém para ouvir meus lamentos.
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— Vou ir ao banheiro — disse, e me levantei.
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Eu não vi para onde eu fui, mas, definitivamente, eu não sabia o caminho para o banheiro, então só vaguei. Minha vontade era de ir embora, e qualquer lugar que minhas pernas me levassem estava bem. Andei pelo que pareceu serem quadras, ou milhas, ou anos-luz inteiros.
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Meu telefone era um peso em meus bolsos, e peguei-o, encarando a luz cálida e azul. Ela me traria algum alívio. Eu sabia que
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Kurt iria me atender.
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Ele conhecia o frio da solidão, ele sabia como era. Ele entenderia.
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Porém, no fundo, eu já sabia. Quando o celular caiu na caixa postal, eu não deixei uma mensagem. Eu sabia que seria inútil. Kurt sempre tinha “problemas de Kurt”.
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eu também tenho a minha vida para cuidar, não posso te foder todas as vezes que você quiser dar pro namorado do seu irmão
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e, no fundo, não importava, porque nada importava; o que é ser uma cinza cósmica em meio a uma explosão de uma supernova?
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Meus dedos agiram por si só, e eu notei o número do rapaz. Eu mal conseguia ler seu nome, mas eu conseguia lembrar de onde o conhecera. Ele tinha dedos bonitos, dedos de ilustrador cheios de carvão, e ainda conseguira me entregar o número, corajoso
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talvez ele me fodesse contra o cavalo
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e talvez aquilo bastasse
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meus dedos discaram.
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— Ei, olá. E aí, gato, será que posso ir para sua casa agora? — Qual era mesmo o nome dele? Eu precisava lembrar. Precisava. Ou não.
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Não ia lembrar depois da foda mesmo. O que era gemer um nome qualquer enquanto estou debaixo de lençóis quentes que imitavam a luz do Sol?
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Sol.
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— Jesse?
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A luz intensa invadiu aquele cômodo e meu ar faltou. Foi quando notei que estava em um depósito, com vários produtos de limpeza, e quem abriu a porta foi Alex, com o olhar consternado.
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Merda.
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— E aí, gato, posso ir para a sua casa?
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Seu rosto se avermelhou, como uma criança pega em uma travessura. Era meio cômico, até porque, você não tinha a idade de falar uma coisa daquelas e ainda parecer tão inocente.
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Mas algo em mim se revirou.
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— Jesse? Com quem você está falando?
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Seu olhar mudou, de uma corça inocente para nenhuma expressão. Vazio. Droga, como eu queria saber o que se passava dentro da sua cabeça, ler seus pensamentos.
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Às vezes, você não percebia os sinais mais óbvios.
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— Com ninguém. — E desligou o telefone.
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Mas havia algo em meu peito. Uma flor havia nascido.
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Dúvida.
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A morte de qualquer relacionamento.
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— Você estava tentando ir para a casa de alguém? De novo?
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Você continuou a me encarar, sem falar nada. Um muro que eu tinha vontade de esmurrar. Era horrível quando você se fechava daquela maneira, e eu simplesmente tinha que acatar. Mas aquilo era um pouco demais para ignorar.
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— Jesse… Não me faça pedir para ver seu telefone.
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— Você é minha mãe agora, Alex?
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A resposta cortou meu coração, a primeira das feridas. Porém, não aplacou o crescimento da dúvida. Como uma hera venenosa, entremeando-se em meu imo e em minhas palavras.
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— Não sou, mas achei que…
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achei que nós tínhamos algo
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— E se eu estivesse?
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Segundos antes de você abrir a boca, eu sabia a resposta. E, francamente, entre o saber e o não saber, a ignorância era realmente uma benção divina. Senti o ar voltar, e desejei, do fundo do coração, voltar para o multiverso em que era ignorante.
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Mas eu sabia agora.
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O vaso de hera venenosa estourado.
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E teríamos que lidar com os cacos.
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— Por quê? — Eu não reconheci a minha própria voz.
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Eu não falava daquele modo. Mas era assim que você me afetava, Jesse. Era assim que eu me perdia em seus tons; e apesar de magoado, eu ainda queria entender. Queria penetrar em seu imo, e entendê-lo.
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Você deu de ombros.
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— Me deu vontade.
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— Pelo amor de Deus, Jesse.
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— Não achei que fôssemos exclusivos.
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Bem. Você tinha um ponto ali. Em todas as nossas conversas e mensagens trocadas, nunca tínhamos colocado um nome no elefante no meio da sala: nossa relação. Ela apenas existia. Mas eu achava… eu realmente achava que…
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— Eu achei que você gostasse de mim — sussurrei.
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Mais um dar de ombros. Como eu queria te esmurrar.
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— E eu gosto. Mas isso não tem a ver com sexo.
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Eu ergui uma sobrancelha.
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— Claro que tem a ver. Você transa com qualquer um?
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Você ficou calado, e a realização me atingiu.
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— Jesse…
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— Era isso que você queria saber? — Seu tom era de mágoa e algo mais escondido, visceral. — Que eu não sou seu par perfeito? Que eu sou um fodido, que não mereço alguém tão perfeito quanto você?
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Eu suspirei.
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— Você não é um fodido, Jesse.
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— Viu, eu ia transar com outra pessoa, e você ainda tenta ser um coach motivacional pra cima de mim! Isso me irrita, sai do seu pedestal, Alex!
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— Eu estou irritado! — Esfreguei minha mão contra as minhas têmporas. Minha dor de cabeça ameaçava se triplicar. — Eu só não gosto de ficar brigando com a pessoa eu amo!
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Isso certamente calou a sua boca. Me deu até vontade de rir, apesar da situação séria.
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— Você me ama? — Seus olhos eram discos incrédulos. Eu me volvi para você, indo em sua direção, e toquei em sua cintura.
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— Não estava óbvio?!
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— Como eu ia saber se você não me fala?
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— Eu sou meio lerdo pra essas coisas. Demoro para entender relacionamentos em geral. Meu último namorado dizia…
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— Ótimo, você vai se declarar para mim e ainda falar de ex.
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— Bem, de qualquer modo, eu também tinha problemas de comunicação com ele. E acho que entendo o porquê. Eu… eu só não quero ser qualquer um. Ou mais um. Eu quero ser seu único, Jesse.
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Nós dois nos sentamos naquele pequeno quartinho de depósito, e ficamos nos encarando um pouco. A pouca luz que vinha da porta entreaberta, iluminava a sua respiração, e as batidas do meu coração se aceleraram.
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Porra.
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Eu tinha me declarado mesmo?
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— E aí, não vai dizer nada?
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Você ficou em silêncio, olhou para o nada por alguns instantes. E, depois, me encarou.
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— Eu ainda ia dormir com outra pessoa.
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— Sim. Acho que temos que discutir isso. Por que você ia fazer isso?
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— Por que eu sempre faço isso quando…
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— Quando?
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Você se abraçou e se encolheu. Era um modo de proteção; ao menos, não estava correndo de mim. O que significava que eu tinha uma chance. Talvez mínima. Mas era tudo que eu precisava.
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— Quando eu não aguento mais viver na minha cabeça. É uma forma de abafar os sons.
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Fiquei em silêncio.
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— Eu também?
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— O quê?
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— Você deitou comigo como uma maneira de aquietar qualquer coisa que esteja dentro da sua cabeça? Eu sou só mais um?
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Não estávamos em completo silêncio, porque ainda conseguíamos ouvir os ruídos e risadas das pessoas no evento; e, por um momento, pensei em Dave, que deveria estar se sentindo sozinho e um pouco assustado de estar em um local tão grande com tantas pessoas. Talvez devêssemos evitar essa conversa e voltar. Talvez eu não quisesse ouvir a resposta.
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a ignorância é uma benção
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— Sim.
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E a hera venenosa do meu coração foi arrancada violentamente, deixando-o a sangrar, e eu me deitei para morrer.
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— E não. Ao menos, no início, foi sim. Mas eu… eu gosto de você, Alex.
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Você abriu um sorriso tímido.
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— Acho que também estou apaixonado por você.
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E, do sangue, nasceu milhares de flores azuis e brancas e roxas e rosas; e enquanto dávamos as mãos, talvez houvesse um final feliz para nós, afinal.
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— Mas somos exclusivos a partir de agora — eu reclamei.
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Sua risada foi uma memória guardada em meu templo como um tesouro, adorada por meu sacerdócio no altar da minha alma. E quando seus lábios tocaram os meus, consumamos todos os ritos da nossa religião.
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Tentamos sair do depósito de limpeza sem sermos notados, em um momento em que houve uma algazarra maior. Você disse que ia no banheiro se arrumar, enquanto isso, eu voltei para a mesa. Queria dizer que minhas feridas estavam saradas, mas era como um enfermo depois de uma cirurgia. Ainda dolorido, e um pouco fodido da cabeça.
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Eu queria te entender.
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No entanto, tudo que eu podia fazer era confiar.
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A mesa estava mais calma. Aparentemente, as outras pessoas da mesa estavam em um papo agitado, e eu notei o problema de imediato.
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Dave.
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Merda.
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Ele estava ansioso, olhava para os lados, e então para o caderno, sem escrever nada. Parecia prestes a ter uma crise, a explodir. E eu trocando uns amassos com Jesse no armário. Como ele ficaria ao saber disso? Eu não podia
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abandoná-lo
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e eu quase corri, mas vi a mão de Sam — embora estivesse conversando animadamente — achar a de Dave, e as duas se entrelaçarem. Vi a expressão surpresa de Dave, e então, um pequeno sorriso em seu rosto. Ele respirou fundo e pareceu relaxar. E, pela primeira vez naquela noite, o vi continuar a escrever, com as mãos ainda entrelaçadas ao outro.
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Céus.
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Será?
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Que as coisas finalmente entrariam nos eixos?
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Meu coração se encheu de esperança. Com você e eu finalmente em paz, e Dave entrando em um bom caminho… as coisas finalmente estavam melhorando. Isso me deixava terrivelmente animado.
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Voltei para a mesa, e Dave estava radiante:
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— Alex! Estou quase acabando!
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— Que bom, Dave.
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— Eu não aguento mais escrever vampiros mordendo virgens… — Samuel parecia enfurnado no teclado do seu notebook, com o rímel escorrendo pelo rosto inchado de sono; decididamente, já estava tarde da noite.
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Ainda tinha muitos comes e bebes, e muitas horas de escrita pela frente, mas eu estava morto (só não tanto quanto as virgens de Samuel). Você apareceu logo depois, ajeitando o meu moletom, que em você ficava ridiculamente grande, mas, aos meus olhos, muito fofo.
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— Eita, vocês dois sumiram por muito tempo — Dave comentou.
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— Estávamos procurando comida decente. — Seu sorriso era diabólico, e eu sabia que estava mentindo para mim. Porque eu ainda não queria contar para Dave.
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Mas ele estava tão bem… tão bem… talvez fosse a hora.
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Eu me virei para abrir a boca, e palavras não saíram. Eu estava travado. Como eu diria a Dave que eu estaria me afastando mais dele? Meu amigo continuou a escrever, incauto, e eu olhei para você, sentado ao meu lado.
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Por debaixo da mesa, você pegou em minha mão, e eu, até então, não reparei o quão eu precisava daquele amparo, daquele singelo toque. Respirei fundo.
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Talvez outro dia.
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E, no fim, Dave conseguiu terminar a tempo, seguido de um exausto Samuel que se jogou em cima do notebook, derrotado. Os sinos do local tocaram, indicando o final do evento.
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E o final de novembro também.
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Levamos Dave para casa; você ia para a minha. Era um hábito seu todas as vezes que queria evitar alguma coisa aparecer no meu apartamento, notei. Eu não me importava, porque apreciava a sua companhia. Porém, às vezes, eu queria que você falasse mais sobre os seus problemas, mesmo que fosse só para reclamar.
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Saímos da biblioteca nas primeiras horas da manhã, enquanto ainda estava tudo escuro. Você caminhava ao meu lado, quieto, com o ar noturno a cair-lhe como um véu sobre os ombros. Estava adorável, e o ar de dezembro lhe tornava tão lindo quanto qualquer mês, mas parecia ser algo especial naquela noite.
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Olhei para cima, e foi quando notei.
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— Olhem! A primeira neve do ano — recitei.
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— Droga. Vamos nos molhar — Dave reclamou.
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— É bonita.
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Ficamos parados um pouco na noite, observando os flocos de neve caírem sobre nós, e depois, seguimos. Não havia nada de especial e, ao mesmo tempo, não era nada comum. Talvez as situações só sejam especiais quando olhamos para trás, mas, vendo agora, eu consigo lembrar de como os olhos de Dave brilhavam ao ver a neve; e seu sorriso, Jesse, discreto, ao vê-lo chutar montinhos de lama em direção aos carros que passavam.
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Era especial.
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E não era.
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E era tudo para mim.
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Dave, animado, continuava a comentar do evento:
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— E Samuel lidou com aquela briga tão bem… queria ter as mesmas habilidades que ele! Além de gerenciador de comunidade, ele também escreve muito bem, ele me mostrou alguns trechos do livro dele, e havia virgens mordendo vampiros também…
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E embalados pelo som da voz dele, eu senti você segurar a ponta do meu casaco. Eu estava de mãos dadas com Dave, mas com a outra mão, eu entrelacei nossos mindinhos brevemente; e naquele pequeno espaço-tempo, eram apenas nós dois na rua escura, andando pela noite.
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Ao chegarmos na casa de Dave, às primeiras horas da manhã, encontramos uma Sra. Kate (cinquenta e dois anos) tomando café na varanda da porta. Se eu era muito protetor com Dave, Kate era a mais coruja das mães. E não era sem motivo.
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— Como foi lá, meninos? — Ela tinha um sorriso afável e um rosto cansado. Afinal, por ser enfermeira, eu tinha a certeza de que ela tinha acabado de voltar de um plantão de doze horas ou mais.
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— Eu acabei o livro! — Dave correu até ela e mostrou o caderno.
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O clima estava ótimo, e, francamente, era uma das noites que eu mais me lembraria. Olhei para você
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os sinais
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eu os perdi?
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e para Dave, que encarava o celular. Imaginei se tratar de uma mensagem de Samuel, porque ele continuava a tagarelar, mas, repentinamente, ele ficou mudo.
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— Vou entrar pro meu quarto — anunciou, e saiu correndo.
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— Ué, não vai nem me mostrar alguma coisa do livro? — Sua mãe ergueu a xícara de café. — Eu passei o café agora, vocês não querem uma xícara?
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— Aceito — eu disse. Quem era eu para recusar o café de dona Kate.
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Porém, antes que eu pudesse me mover, Dave colocou uma mão no meu peito, me impedindo, e saiu correndo em direção às escadas.
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— Dave? — nossa voz em uníssono perguntou em tons diferentes, mas o rapaz não chegou a ir muito longe; especialmente quando se curvou nas escadas e expeliu todo o conteúdo do seu estômago em cima do carpete.
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— Dave! — Dona Kate deixou a xícara e correu para o filho. — O que você tem?
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Dave parecia muito pálido de repente.
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ele ainda tinha o celular em mãos
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— Nada, mãe. Acho que comi alguma coisa estragada no evento.
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— Mesmo? Bem, eu cuido das coisas a partir daqui, Alex. — Kate assumiu o papel de mãe, e acenou. — Podem ir.
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Eu estava apreensivo, e não queria deixar Dave naquelas condições, mas já que ele estava com a mãe, ao menos, ele não ficaria sozinho. Você me puxou pela manga do casaco e, juntos, enfrentamos a noite.
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Interlúdio
— Ele ainda estava com o celular.
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Você não me respondeu. Seu olhar era azul intenso e gélido, e estava começando a me cansar com seus enigmas.
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— O que fazemos com celulares? — foi a sua pergunta-resposta.
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— Nos comunicamos com eles. — Dei de ombros. — Mandamos mensagens.
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Sua expressão mudou para um sorriso lateral. Sabichão, sabido, esperto.
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uma mensagem
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— Esse foi o primeiro sinal?
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Você se levantou e foi em direção à janela, em direção às hortênsias. Era uma visão e tanto: seu torso nu, e a tatuagem em suas costas parecia brilhar como os cosmos. Cada veia sua pulsava tal qual uma galáxia, e sua vida ressonava na minha.
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estou vivo
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estamos vivos
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Você tocou em uma hortênsia, e ela explodiu em uma supernova.
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— Existem primeiros sinais? Estava ali o tempo todo… quem não viu foi você.
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E quando eu olhei para baixo, o cigarro em minha mão havia queimado por inteiro, sem eu dar uma tragada sequer.
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O fogo queimou tudo.
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o cheiro de cigarros, a queimadura
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o quarto, a navalha
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a ponte, o rio
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eu
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Eu respirei, e continuei a lembrar.
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